segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Muito, muito mas mesmo muito obrigado, Liédson!

LiedsonLiédson regressa ao Brasil depois de mais de sete anos a jogar e a marcar no Sporting, um jogador que ao longo deste tempo se destacou pela impressionante capacidade de marcar golos fosse por terra ou por ar. Escorregadio e estreito, Liédson deu água pela barba a todos os defesas do Campeonato Português e a sua partida de Portugal é visto como boas notícias para muitos dos seus oponentes. Luisão, por exemplo, vai poder começar a dormir mais descansado. O 31 do Sporting regressa ao país natal sete anos e meio e mais de 150 golos depois pelos mesmos valores que foram pagos na longínqua temporada de 2003, o que pode ser considerado como um bom negócio. Ao longo desde tempo Liédson teve ainda tempo e qualidade suficiente para ser chamado à Seleção Nacional tendo tido papel preponderante na reta final da qualificação para o Mundial da África do Sul com golos cruciais frente à Dinamarca e Hungria, tendo também faturado na épica porém inútil goleada frente à Coreia do Norte.

Liédson foi um exemplo dentro das quatro linhas, um futebolista de talento muito acima da média que tanto marcava triveladas quase de fora da área como saltava como se fosse uma pulga entre paredes de defesas centrais para cabecear a bola para dentro das balizas. O Levezinho tinha também o dom da omnipresença pois imediatamente após um movimento de finalização adversária aparecia a fazer o carrinho no meio-campo dos leões, pressionava até recuperar a bola, começava o lance ofensivo e muitas vezes era mesmo ele quem aparecia a definir a jogada. Não me lembro de ter visto um atacante tão raçudo, tão chato e tão eclético porém tão terrivelmente eficaz como Liédson. Jardel era fulminante no jogo de cabeça mas jogava dentro dum quadradinho, Manuel Fernandes era mais técnico mas não tinha o poder aéreo do brasileiro, Jordão também era felino mas não tinha a sua eficácia, o Chirola Yazalde era um trator enquanto Liédson não fazia peso na relva e Peyroteo era de outro campeonato e provavelmente de outro mundo.

Liédson da Silva Muniz será sempre um símbolo daquele Sporting que, como referi, já não existe. A saída de Liédson do Sporting representa muito mais do que um futebolista de eleição que saiu da equipa – vamos ver agora o grau de Liedsodependência que o Sporting tem – mas o adeus de provavelmente o último jogador que animava os sportinguistas, que lhes dava a esperança de alguma magia e de momentos bons. Liédson sai do Sporting e nós já temos saudades dele, agora quem é que resolve?

Que façam justiça e que retirem o “31”, ninguém terá categoria suficiente para envergar aquele número nas costas.

 

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Joga, bonita!

Izabella Lukomska-Pyzalska Na cidade de Poznań não existe só o Lech, campeão nacional de futebol em título, mas também o Warta Poznań, um clube substancialmente mais pequeno que até já ganhou dois campeonatos da Polónia. O Warta navega nas profundezas da segunda divisão polaca ocupando o antepenúltimo lugar e seria despromovido ao terceiro escalão se o campeonato terminasse hoje, nunca ninguém terá ouvido falar de tal clube fora da Polónia, claramente ninguém ouviu falar do Warta em Portugal e eu continuaria sem saber que o clube existe se não fosse viciado no Football Manager.

Esse insignificante clube da Grande Polónia elegeu recentemente novos corpos diretivos e eu chamo a especial atenção do leitor para o corpo daWarta a pena presidente, Izabella Lukomska-Pyżalska, ex-coelhinha em plena frescura radiante dos seus lindos 33 anos. Tire as conclusões que quiser, compare os nossos “papas” e “orelhas” com este exemplar de novo-dirigismo polaco porque eu só lamento ter vindo para este país em fim de carreira. Calçava fácil na segundona cá do sítio, ganhava umas belas coroas para os pierogi da reforma e se calhar ainda assinava contrato vitalício com o… digo, a presidente. @#%$*& de tempo perdido em Faro!

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Styczeń

Janeiro Gosto muito de conversar com a Ola, uma rapariga que faz a aliança de duas coisas raras de acontecerem simultâneamente numa mulher: ser linda e inteligente. Esta extraordinária ocorrência permite focar-me exclusivamente numa ótima conversa porque a concentração fica presa no tema e não baila entre os seus inebriantes olhos esmeralda, as insinuantes linhas peitorais ou os sensuais lábios que fazem cada de palavra um poema sussurrado por um pardal. Seja como for, através da nossa conversa de hoje concluimos que o janeiro é uma bosta.

Realmente o mês de janeiro é um dos piores meses do ano só comparável a setembro, o mês da curva descendente da moral na ressaca da euforia do Natal e Ano Novo, a quadra dos presentes, das grandiosas bebedeiras de São Silvestre, das resoluções e todos os planos. Ressaca financeira justamente devido aos presentes, ao reveillon, às bebedeiras, regresso ao trabalho e à rotina. Janeíro é a segunda-feira do ano e nós sempre achamos o fim de semana curto demais, um mês que começa cheio de pica e projetos novos que cedo definham e não vivem mais que 20 / 25 dias. Não há nada em janeiro que se celebre, que anime ou que dê gosto. Janeiro é um mês vazio de emoções positivas e mesmo aquilo que alegra o pessoal, o pilim ao fim do mês, demora mais a chegar porque janeiro tem 31 dias. Ainda por cima este ano calha a uma segunda-feira, um dia de merda como são todos em janeiro.

Poucas coisas boas há em janeiro. É feio fazer anos em janeiro (eu faço  em dezembro e não dou pulos de contente por isso) porque é inverno no hemisfério norte,Janeiro na Polónia chove em Portugal e neva em Varsóvia, está frio e escuro, não há vontade de jantar fora nem de conviver com os amigos, ficamos sagorros e sem ânimo para sair de casa. Janeiro é uma treva, uma ansiedade, um deserto entre a loucura da passagem de ano e a folia do Carnaval, esse franchise que os brasileiros exportam excelentemente e que os europeus aproveitam para espantar o mofo de janeiro. Do Carnaval à primavera é um saltinho e tudo acontece mais rápido, os dias são mais longos, começa a haver mais claridade mas nada disso sucede no malfadado mês de janeiro.

Por isso eu e a Ola, essa rapariga que tem de inteligente o que tem de bela, concluímos que janeiro não tem ponta por onde se lhe pegue e que julho é bem melhor. Porquê? Porque a seguir entra a…gosto q;)

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Reflexão em tempo de hibernação

Agora que estou em período de hibernação e que pouco há a contar sobre as minhas aventuras na Polónia, apetece deitar refastelado no sofá, servir-se duma Amarguinha, ligar o televisor e “ouver” o que se passa no meu país. E o que me traz a televisão desde Portugal?

  • Um romance de faca e alguidar em tons de cor-de-rosa e vermelho-sangue para entreter as donas-de-casa. Tudo o que se puder dizer sobre este tema é especulação e mais um caso em que pouco transpirará de verdade para a opinião pública. Nunca se irão conhecer os gestos que se deram naquele quarto da mesma forma que possivelmente nunca se saberá o que aconteceu à Maddie ou no avião que se despenhou em Camarate, apesar de termos evidências claras em todos os casos;
  • O inefável Ricardo Rodrigues, cujo nome só escrevo com letra maiúscula por respeito às regras gramaticais, apareceu num canal televisivo a dar palpites sobre as eleições presidenciais. O douto ladrão Rodrigues que gamou os instrumentos de trabalho de jornalistas que ousaram fazer-lhe perguntas incómodas mostrou-se publicamente de ar sereno e credível protegido pela grossa capa de impunidade legitimada por um povo sossegado e ceguinho que perdoa a pouca-vergonha dos seus governantes desde que o clube ganhe ao domingo e que “o meu” chegue no fim do mês;
  • O Presidente da República em exercício que não consegue explicar a quem comprou, a quem vendeu nem onde teve uma quantidade de papéis que para muito bom português representa 10 anos de trabalho. Fala de empresas estrangeiras de nomes esquisitos como se os portugueses fossem todos diminuídos mentais, tem vizinhanças menos recomendáveis que os irmãos Dalton, rege um país em que se apresentam registos das pessoas dizendo que coagiram, corromperam, forjaram e falsificaram mas onde esses mesmos registos não valem, não fazem fé, não são tidos como bons porque foram obtidas num dia de chuva ou porque as pilhas não eram da marca que tinha ganho o concurso de adjudicação;
  • As PMEs a fecharem, os centros de saúde a fecharem, as escolas a fecharem, as fábricas de têxteis e calçado a fecharem, os alunos a terem de devolver propinas e o Governo a entrar com milhões para salvar bancos que desbarataram o capital dos seus clientes em obras de arte, terrenos no estrangeiro, vivendas principescas e toda a espécie de ladroagem de colarinho branco que haja nos compêndios;
  • O combustível cada vez mais caro, as gasolineiras com cada vez mais lucros e as bombas de gasolina junto da fronteira cada vez mais vazias.

Por isso ontem fui ver um apartamento aqui em Varsóvia, um T2 em completa remodelação para dar aquele saltinho qualitativo. Já que Portugal me convida cada vez mais a ir ficando por cá uns tempos valentes ao menos que seja com conforto e num espaço a que chame meu.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Os Fidalgos da Casa Leonina

O Princípio de Peter diz que todo o funcionário tende a ser promovido até ao nível da sua incompetência e esta frase podia ser a legenda a acompanhar as peripécias de José Eduardo Bettencourt como presidente do Sporting. Não vou esmiuçar os passos perdidos do dirigente leonino porque essa é matéria para os especialistas, vou apenas deixar a opinião dum adepto anónimo que vale aquilo que vale.

JEB JEB é um sportinguista acima de qualquer suspeita, adepto de cachecol ao pescoço e de palavrão na boca se for caso disso. Sente o Sporting como poucos, sofre com Ele e sente-se incapaz de negar a sua ajuda ao Clube. Participou em estruturas de SAD e foi preponderante no melhor negócio do Sporting dos últimos 100 anos que foi trocar Spehar, Mpenza e Horvath pelo 60-golos-por-época Jardel. Infelizmente foi o sportinguismo agudo que o tramou e ao Sporting porque da mesma forma que Carlos Queiroz nunca será um bom treinador de banco, embora seja mestre na planificação e estruturação duma equipa de futebol, JEB nunca será um bom presidente de clube apesar de ser um gestor de méritos reconhecidos e de honestidade insuspeita.

O que lixou o Sporting (e JEB) foi o surgimento duma conjuntura que tornou inevitável a sua candidatura a presidente e consequente vitória, conjuntura consubstanciada em ausência de concorrência credível, discurso apelativo ao sócio e adepto, com mais bola e menos banca. Ele nunca escondeu essa ambição, o sonho de menino, de ser presidente do seu Clube. Era então ou nunca e JEB aceitou o desafio que o Sporting lhe propôs, o Clube precisava dele e ele serviu-o mesmo contra os conselhos de muitos que lhe estavam próximos. Assim é JEB, no Sporting o coração sobrepõe-se à razão.

Mas o “Obama Branco” não é o homem certo e isso viu-se na forma como se despistava em declarações aberrantes como copiar o FC Porto, comentar o fundo de investimento que tem parceria com os gajos do outro lado da rua, Paulo Bento forever, vender Tonel e comprar Torsiglieri, renovar com o Pedro Silva, maçãs podres relativizadas, Pongolle por 6 milhões e comparar o seu salário com o do Abel. Costinha serviu para passar o microfone e evitar mais dislates mas foi pior a emenda, repetida com Couceiro, do que o soneto com Izmailov a ver assinada uma certidão de óbito prematura e declarações de anti-qualquer coisa que não dignificam nada nem ninguém.

Que se escreva em acta que não critico JEB, ele fez o que qualquer sportinguista faria no lugar dele, chegou-se à frente quando o Clube estava aflito, ajudou, foi corajoso e não precisava de mais dores de cabeça quando assumiu o cargo. Não fez melhor porque não sabe, porque é um homem de cifrões e não de pitões, porque se rodeou mal devido a não ter vocação para o cargo. Se calhar precisava de mais tempo mas o Sporting não tem tempo, está a soro, ligado à máquina e em morte cerebral. Preocupa-me é a completa ausência de alternativas credíveis, de sportinguistas competentes, de homens de trabalho que se dediquem mais a devolver ao Clube a dimensão outrora tida do que vestirem Tommy Hilfiger com sapatos de vela.

Precisamos de sportinguistas, eles que se cheguem à frente como JEB fez (e se não for pedir muito, que impeçam o Rogério Alves de se candidatar).

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Na Polónia sê Polaco - 11

Jantar:

Rissóis de couve fritos em azeite e uma chávena de sopa instantânea de beterraba.

O choque (já) não está na composição da refeição, está no facto de achá-la natural, adequada e de me ter sabido bem.

Ai, se a minha avó soubesse…

pierogi e barszcz

ps – Mário, daqui ouço-te a comentar: “Tás todo fodido…”

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

A paranóia da canela

canela Vista e revista mas sem ter recebido importância, a saga da canela no inverno polaco é um caso sério. Não há lado nenhum de Varsóvia onde não se cheire ao condimento apodado de exótico afrodisíaco, está presente em todas as pastelarias, nas lojas de decorações, nos corredores dos centros comerciais, em toda a parte. É difícil fugir à canela durante o frio e devia haver um estudo que se dedicasse ao fenómeno.

Está fresco (a sério, está só fresco e não frio) na rua e dá vontade de beber um chocolate quente, entregam-nos a lista e aparece em ponto de destaque a especialidade da casa, um chocolate todo tal e coiso com o travo especial de canela. Se quisermos optar por uma bebida mais aquecedora temos o grzaniec, um vinho quente aromatizado com cravinho, nuances citrinas e com canela. Mas acaba por nos apetecer um bolinho, uma dose de açúcar ideal para nos fornecer a energia que a escuridão invernal nos suga e logo aparece uma panóplia de tartes de maçã salpicadas com canela, de pączki polvilhados de canela ou o diabo a quatro com canela.

Esqueçamos os comes e bebes e vamos às compras. Eu, que não me considero muito abichanado apesar de algumas opções, gosto de ter a casa a cheirar bem, tenho aromatizadores elétricos e quando quero impressionar até compro umas velinhas para perfumar o “parque de diversões”. É missão impossível descobrir velas de baunilha, de essências marinhas, de chocolate, de passiflora. Não. Há velas de canela e é para quem quer.

Mas não se pense que a canela é uma nóia exclusiva dos polacos porque os portugueses também guardam para a dita especiaria lugar especial à mesa com igual ênfase na quadra natalícia onde reinam as fatias douradas, o arroz doce, as filhozes e a enigmática aletria que nunca cheguei a perceber se se trata dum arroz que não chegou a esparguete ou dum esparguete com complexos de arroz. Denominador comum destes petiscos? Ora bem :)

Jorge Amado descreveu a cor da pele de Gabriela como toda a gente sabe e conhece, o seu estilo majestoso fez do pau e pó castanhos um sinónimo de saúde e beleza. Por minha parte, comeria com a mesma satisfação um pastel de nata, um pires de arroz doce ou uma empanadilha sem ter de a borrifar com canela. É verdade que não dispenso um par de pauzinhos de canela quando produzo a minha afamada sangria… mas não se consegue encontrar velas de outro cheiro? Epa, tenham paciência!

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Reis

Ontem não trabalhei porque era domingo, anteontem também não porque era sábado, trasanteontem não trabalhei porque fiz ponte devido ao facto de pela primeira vez na história o dia de reis ter sido declarado feriado nacional na Polónia. Viver num país constitucionalmente católico… é do mais lindo!

dia-de-reis

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Refilar para quê?

Mais de vinte graus de diferença entre a temperatura em Faro e em Varsóvia, mais de vinte graus em menos de dez horas. Este era o panorama que a cidade me ofereceu à minha chegada.

Ursynów em janeiro

Vinte e quatro horas antes eu tinha estado a jogar futevólei na praia, há coisas do caraças…

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

mishanapolonia - MMXI

Não é a vida nova do ano novo mas uma imagem nova da cidade de sempre, a Cidade Capital que agora surge numa perspetiva mais moderna, a Varsóvia aguerrida e vibrante que melhor conheço, a Gotham City do Leste Europeu.

É linda, esta minha cidade. Não é?

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Ilha do Farol, Eindhoven, Varsóvia

Ilha do Farol Há sempre algo a reter em cada viagem que fazemos, os lugares e pessoas que conhecemos, os sabores e cheiros que provamos, as sensações que experimentamos. Há sempre uma estória que se retém, um episódio que permanece na memória, um momento que fica escrito nos anais mesmo que seja repetição de coisas já vistas e feitas. Viajar é um ato de crescimento, de aprendizagem e de abertura para o mundo e a viagem que agora faço (Faro – Eindhoven – Varsóvia) foi mais uma página boa que escrevi no diário de bordo.

Primeiro pela magnífica festa de fim de ano passada na companhia de excelentes amizades antigas e recentes, pessoas com as quais já mantinha laços de relacionamento muito estreitos que me apresentaram a grandes companheiros de borga, homens e mulheres interessantes que proporcionaram a borga ideal no ambiente perfeito para tal. A Ilha do Farol e a casota que o Baranito administra parecem talhadas propositadamente para o efeito, na esquina sudoeste da ilha entre o oceano e a Ria com panorâmica privilegiada para a costa algarvia, Faro e Olhão. O plantel que se juntou foi escolhido a dedo, cozinheiros de mãos largas que não deram descanso às brasas do fogareiro desde a noite de dia 30, alquimistas da sangria e da gelatina de vodca que ajudaram a desenjoar das mais de cem minis que se consumiram em duas noites, fadas das sobremesas, dos folares, dos brigadeiros, dos ananases com leite condensado e das tartes de amêndoa que não paravam de vir da cozinha para a mesa. A facilidade com que se riu, com que se criou camaradagem com quem vem de fora, com que se partilharam anedotas e episódios divertidos, fados sentidos e karaoke etílico, tudo o que é típico nas passagens de ano do Farol repetiu-se este ano com personagens novos mas com a mesma mística que os novos convidados encarnaram com perfeição para que a Ewa testemunhasse como se vive o fim do ano à beira-Ria.

O fim da quadra foi em tons de contentamento, de barriga cheia e de esperanças para o novo ano. Uma escala de oito horas em Eindhoven nos Países Baixos permitiu dar um pulo até ao centro desta cidade e conhecer um pouco da região, como se vive e como se trabalha. Descobri uma cidade atraente sem manifestações de modernidade agressiva como edíficios de linhas impressionantes ou arranha-céus megalómanos. Antes apareci num largo simpático rodeado de calmos restaurantes e boutiques famosas mas pequenas na qual se ergue uma estátua do sr. Frits Philips, emérito cidadão de Eindhoven e um dos presidentes da empresa com o mesmo nome que dá brilho à cidade e ilumina-a no mundo. Num desses restaurantes comi um dos melhores hambúrgueres de que me lembro e fiquei admirado com a funcionalidade dum centro urbano que tem a principal estação ferroviária, o núcleo comercial de ruas pedonais e o estádio da equipa local (que até já foi campeã da Europa) num raio de cinco minutos a pé. Mais surpresa causou a existência de ciclovias por toda a cidade (e haver ciclistas a montar bicicletas com 2ºC), uma faixa central em cada avenida destinada exclusivamente para os autocarros para que não hajam engarrafamentos e o arranjo e limpeza dos ajardinados arredores onde nas paragens de autocarro até há parques para aparcar bicicletas.

Eindhoven pôs-me a pensar numa coisa que já tinha pensado há uns tempos, se a capacidade de adaptação que revelei em Varsóvia se aplica noutros locais, se eu conseguiria obter os mesmos resultados que P1060776 consegui em Varsóvia noutra cidade, o que eu poderia dar a Eindhoven e o que a cidade teria para me dar. Passear na Markt Straat foi como visualizar-me naquele contexto das bicicletas na neve, no canal a passar nas traseiras do Philips Stadion, nas casinhas escuras de Veldhoven, num aeroporto internacional a 10 minutos de casa com low-costs a voarem para todos os cantos da Europa a preços camaradas, aprender mais uma gramática diabólica e cânticos de futebol estrangeiros, tirar passes de transporte público, memorizar números de autocarro e marcar um ou dois supermercados perto de casa para as compras da semana.

O prazer de voltar a Faro é imenso, infindável e já aqui o referi muitas vezes, porém o frenesim que se instala em mim sempre que visito uma cidade nova nem que seja por uma tarde como foi o caso ora referido de Eindhoven é difícil de explicar. Às vezes gostaria de não ter ficado tanto tempo estagnado em Faro e de ter saído mais cedo, ter descoberto mais coisas, ter mais carimbos no passaporte e mais experiência de vida. Mas o devaneio dura pouco e escrevo num céu algures entre a Alemanha e a Polónia porque D. Varsóvia espera-me, umas vezes uma simpática e trémula velhinha de cabelos brancos curvada pelo peso da sua história arrasadora, outras uma amazona implacável e autoritária que não se deixa comover com as limitações das pessoas e que as suga até às últimas das suas capacidades e energias, outras ainda irresistivelmente sensual, Circe eslava que apaixona e enfeitiça o comum dos mortais até o deixar inapelavelmente ajoelhado aos seus pés.

Como amanhã, a partir das 6:30, ela ter-me-á uma vez mais como um seu servo, patroa déspota e sem coração que me exige tudo durante a semana mas que se escarcha em prazeres para mim no fim de semana. Aqui vou eu, Varsóvia, pronto para ti. Que tenhamos os dois um belo 2011!

ps – Um abraço especial para o Panda cujas passagens de ano nunca mais serão as mesmas. Ânimo, amigo. Quem tem um pai que cultivou tanta amizade e tanto respeito não pode estar triste por ter partido mas orgulhoso pelo que ele fez enquanto vivo. Às vezes, nos dias piores, lembro-me dele, a voz rouca a puxar por mim enquanto alongávamos no fim dos treinos: “Vamos lá, Soviético! Mais um milímetro, mais um milímetro. Isto é o Farense, não é o Parragil” E eu lá me estico mais um milímetro e vou levando a água ao moinho.