terça-feira, 18 de junho de 2013

A Grande Tromba de Água de Domingo

Na semana passada, uma imagem desoladora correu mundo. Varsóvia debaixo de água, a consequência dum fenómeno de precipitação intensa (20 litros por m2,nalgumas zonas até duas vezes mais), que apanhou a cidade desprevenida e que causou imenso transtorno aos habitantes da capital polaca. O pior sucedeu no domingo de manhã com várias áreas a serem inundadas pela água da chuva principalmente na Trasa Armii Krajowej, uma via rápida a norte da cidade que liga a estrada proveniente de Białystok com a autoestrada para Łódź e Poznań, onde vários carros ficaram submersos tendo os seus proprietários que esperar pela ajuda empoleirados nas capotas. Quatro estações de metropolitano estiveram encerradas devido à água que invadiu as plataformas impossbilitando o funcionamento das comboios. Felizmente tudo ocorreu num fim de manhã de domingo (das 11:00 às 14:00) o que não complicou demasiado a vida aos varsovianos, no entanto isso não impediu que muitas vozes se levantassem a criticar as deficientes infraestruturas da cidade e a atuação da Presidente da Câmara, Hanna Gronkiewicz-Waltz no que concerne ao caso específico da Trasa AK, uma artéria que já tem historial de inundações. 

Nas declarações subsequentes ao acontecimento, a Presidente da cidade atirou responsabilidades para a GDDKiA (Generalna Dyrekcja Dróg Krajowych i Autostrad, o equivalente polaco à 'Estradas de Portugal'  - antes JAE ou IEP) dizendo que "está à espera que a Direção Geral de Estradas inicie as reparações na Trasa AK agendadas, ao que tudo indica, para este ano e para as quais decorre concurso de adjudicação". Confrontada com o facto de não ainda não ter encetado obras no obsoleto (datado dos anos 80) sistema de escoamento de águas, Gronkiewicz-Waltz justificou a decisão com "os enormes perturbações que um corte total da via causaria aos automobilistas" e que essas obras "terão lugar aquando a renovação do piso para não se ter de cortar a estrada duas vezes". A responsável adianta que os coletores de esgoto da secção norte de Varsóvia esgotaram a sua capacidade e que não há capacidade financeira para intervir de forma mais eficaz.

Nesse domingo eu passei duas horas à espera que a chuva passasse para poder ir ao supermercado. Claro, podia ter pegado num guarda-chuva e abalado mas detesto chuva e prefiro esperar o tempo que for preciso até que pare de chover do que me meter debaixo de água. Depois vi nas notícias as desoladoras imagens de Varsóvia coberta de água e envergonhei-me duma capital europeia sofrer tais embaraços sem ter um plano de prevenção eficiente, sendo que achei a questão da "falta de capacidade financeira" uma desculpa idiota sendo Varsóvia a cidade do país onde se gere mais riqueza. Porém a desculpa não é assim tão idioto pois embora Varsóvia seja de facto a cidade onde mais dinheiro se faz na Polónia, (talvez mais de) metade do dinheiro que é criado na Capital não fica na Capital. Explicando:


Três quartos dos habitantes de Varsóvia não são de Varsóvia, trabalham em Varsóvia mas não reside oficialmente na cidade. Estas pessoas estão registadas nas suas cidades de origem e por esse motivo é lá que pagam os seus impostos, daí que apenas 25% da riqueza criada na cidade possa ser aplicada na própria cidade. Isso já dá uma ideia da disparidade entre o dinheiro produzido e o dinheiro investido. A somar a esta situação há ainda o imposto de coesão Janosikowe, uma taxa que obriga as voivódias (divisões administrativas equivalentes aos distritos portugueses) que tenham receitas superiores a 150% da média do país a pagarem pelas outras com menos dinheiro. Isto obriga a que a Mazóvia, região onde se situa a capital da Polónia, contribua de forma gigante para este fundo de coesão independentemente se a riqueza produzida pela região seja gasta na mesma região. Tal imposto trava o desenrolar de muitas obras essenciais para o desenvolvimento de Varsóvia, um perfeito exemplo é a segunda linha do metropolitano onde as obras de pelo menos duas estações vão ter de esperar por fundos da União Europeia porque a cidade não pôde disponibilizar dinheiro por ter de pagar o Janosikowe referente ao ano passado.

Pode-se assim perceber que as situações estranhas e surreais que acontecem na Polónia não são exclusivamente consequência de incúria e incompetência dos seus governantes mas por condições anteriormente impostas que os ultrapassam, o Janosikowe está constantemente a ser posto em causa pelas voivódias mais ricas mas o lóbi criado pelas mais pobres impede que o imposto seja abolido. E é compreensível, além de receberem os impostos dos 'engravatados de Varsóvia' ainda recebem dinheiro do fundo polaco de coesão. Quem está disposto a abdicar dum bolo assim?