domingo, 26 de abril de 2015

Um artigo sobre uma cidade e prazeres avulsos que a mesma me devolveu

Rio Brda em Bydgoszcz Ultimamente tenho andado com a estranha ideia de que o clima polaco é melhor do que o algarvio. Este é um pensamento que não me atrevo a dizer em voz alta porque não quero que me espetem o garfo dos hereges no pescoço mas que matuto cada vez mais à medida que o tempo vai melhorando. Se calhar esta minha afirmação tem a ver com a subida da temperatura que já me deixa andar de manga curta na rua ontem à noite em Bydgoszcz, prazer desde há muito vedado pelos condicionalismos do frio mas que ontem foi finalmente concedido. Na Polónia temos o pior do frio e o melhor do calor, estamos em contacto com realidades extremas, aprendemos e adaptamo-nos, sabemos estimar o doce do sol porquanto penamos o azedo da neve.

Se nós estivermos constantemente expostos a bom tempo não o sabemos valorizar, não apreciamos o calor se não tivermos experimentado o frio. Uma das barbaridades repetidas por alguns dos meus companheiros de areal em frente ao Restaurante Zé Maria, como é hábito e costume, que sempre me fez confusão era: ‘Moss, já tou farto de praia!’ Haviam de levar com quase meio ano abaixo de zero para começarem a agradecer a bondade com que a criação do mundo prendou o Algarve e a desfrutar das noites temperadas quando elas aparecem. As primeiras semanas de calor do ano são recebidas por mim com muita alegria não só pela energia que o astro-rei me transmite, nem apenas pelo encurtar das peças de roupa que possibilitam a observação a olho nu de peles e carnes alvas que já estavam sufocadas pelo frio niveal, observação que obriga a redobrados esforços de concentração durante a aula e a maior rigidez muscular nos corredores da escola para não cair na tentação de micar os tentadores decotes ou as apetitosas coxas das estudantes, mas como pela nítida melhoria que os raios solares causam no humor dos polacos, qual sessão intensiva de psicanálise ao fim da qual temos um povo inteiramente liberto das lamúrias que foram espalhando ao longo do inverno.

Ontem tive uma atuação em Bydgoszcz, cidade com pouco mais de 350.000 pessoas e que é uma das capitais da província da Cujávia-Pomerânia. Foi a primeira vez que estive nesta cidade e estava com bastante curiosidade em conhecê-la porque já tinha estado em Toruń, a outra capital da província, tinha então tido uma ótima impressão e queria comparar as cidades até porque jáAbril, hormonas mil tinha ouvido que Bydgoszcz era bem mais feia que Toruń – talvez devido à rivalidade ideológica que separa as duas cidades desde há séculos. As imagens que guardei de Bydgoszcz foram bastante positivas, tanto a nível das pessoas que lidaram comigo como do ambiente que respirei ao caminhar por ruas bonitas como a rua Gdańska que com o seu garboso Hotel Pod Orłem me fez lembrar um pouco a rua Piotrkowska em Łódź, ou a rua Jagiełłońska que encaminha pessoas e viaturas para a Plac Teatralny, uma linda praça que abre a cidade para o rio Brda. Aqui senti aquela impressão que temos quando percebemos que estamos num lugar bom, há um rio em Bydgoszcz e só as cidades com caráter têm rio. Passeei alegremente pela praça e vi o trânsito de pessoas para um lado e para o outro, satisfeitíssimo da vida por enfim poder andar na rua de manga curta, por acabar a festa com o sol quase a raiar numa esplanada a comer pizza com algumas das miúdas que estavam na discoteca e por finalmente voltar a ouvir piropos de polacas, coisa que se vem tornando raro em Varsóvia devido à recente invasão de hordas ibéricas de estudantes e trabalhadores com certeza atraídos pelo que ouviram das lendas do leste europeu.

Andar de manga curta à noite na rua. Eis um pequeno prazer a que muitos não dão o devido valor. Foi preciso eu fazer 250 km até ao centro da Cujávia para compreender isso.

Sem comentários: