Na minha actividade profissional encontro muitos polacos que falam razoavelmente espanhol e que tentam aprender uma segunda língua latina. Pela proximidade com o idioma aprendido e pela possibilidade de entrar num mercado que tem muita representatividade no seu país, os polacos descobrem o português como o exotismo linguístico de eleição e mostram-se muito interessados em aprender a nossa língua. Todos os dias dedico-me a limar as arestas afiadas do sotaque castelhano aos alunos mais desenvolvidos no espanhol, tentando suavizar-lhe o irritante
flamenco que lhes sai da boca sempre que a abrem. Franzo sobrolhos quando ouço um
pero em vez de
mas e coço o ouvido quando aparece um
mientras no lugar do
enquanto. O pessoal acha piada, corrige e procura não repetir o erro aprendendo assim a falar bom português (teoricamente). Há pouco tempo, a Magda levou-me quase à histeria quando inocentemente perguntou: "Mas Portugal e Espanha, tão próximos que estão, vocês certamente são amigos. Vocês gostam dos espanhóis, não é?"
Engoli a resposta vernácula que me veio automaticamente à cabeça e raciocinei um pouco para que não parecesse ordinário. "Ora, deixa cá ver como é que eu explico que não gostamos daquela gentalha..."
Pensei na sabedoria popular que fala de ventos e casamentos mas tenho boas amizades de mães espanholas e o argumento cairia logo aí. Passou-me a ilustre
Dona Brites, minha conterrânea, pela cabeça mas a lenda poderia confundir os polacos e se calhar punha-os a pensar que eu ando metido com narcóticos. Rechacei a conversa que "a Espanha é um país amigo" dado que na minha opinião a Espanha é um país irmão pois os amigos podemos nós escolher.
Andei a anhar alguns segundos quando tive de dizer alguma coisa para que o silêncio não sufocasse a sala, balbuciei introduções e fui dizendo que os portugueses não gostam dos espanhóis da mesma maneira que os italianos não gostam dos franceses e vice-versa. A minha explicação fê-los acreditar que os países latinos não se gramam uns aos outros, o que até nem é mentira nenhuma, mas trouxe outra pergunta com água no bico. A Magda, pele de leite, olho de mel no sorriso largo:
-Então, afinal, de que país gostam os portugueses além de Portugal?
-Da Polónia, querida. Gostamos imenso da Polónia.
Estivésse eu em Faro e remataria com um "atão na sabes?..."