quarta-feira, 28 de julho de 2010

O sol, o sal… o Sul

Algarve Uma semana depois de ter chegado a Faro, ou melhor, à Praia de Faro é altura de se fazer um balanço do estado de coisas que vim encontrar. Em primeiro lugar é fundamental recordar que a Praia de Faro continua a ser um local extraordinário para se apanhar sol e tomar banho de mar. Já se sabe que não é sítio para grandes festas como a Praia da Rocha nem é uma praia onde os paparazzi podem encontrar figuras mediáticas como em Albufeira mas é uma praia que cumpre a sua função. Tem ótimo areal e águas mornas para gáudio dos seus utilizadores. Este ano parece-me mais arejada devido às condicionantes de estacionamento que a Câmara Municipal impôs, menos carros e mais espaço para circular, há um comboio que traz pessoas para a praia e os barcos da carreira continuam em funções. A Praia de Faro está melhor e isso vê-se na facilidade com que se pode andar nos seus arruamentos.

Nas minhas férias de Verão raramente vou à cidade porque não tenho vontade nenhuma de sair da praia, vivo rodeado de betão e asfalto durante 11 meses do ano e não tenho contacto com areia e mar sem ser nos dias que passo no Algarve. O sol amolece a vontade de conferir se a cidade está no mesmo ponto em que a deixei ou se há novidades. Uma novidade apraz-me registar, parece-me que a moral do povo não está tão derrotista como no ano passado em que toda a gente estava desmotivada e assustada, sinto ainda uma crise de confiança mas não tão notória como em 2009. A crise económica mundial atingiu a Polónia ao de leve e não se viram os mesmos efeitos que em Portugal, por isso assisti com algum choque ao medo com que os meus amigos encaravam os tempos vindouros em contraste com a calmaria económica que reinava em Varsóvia.

O sol amolece também a inspiração e por isso os artigos são mais espaçados, um blogue que se baseia nas impressões que um algarvio tem sobre a Polónia não terá muito tema quando esse algarvio está no Algarve. Há muito sol e não se recupera facilmente a energia que se Varsóvia gasta a levantar da toalha, é preciso usar de parcimónia quando se mexe o corpo a não ser que seja para correr atrás de uma bola ou de caminhar custosamente até ao mar. São as férias e é para isso mesmo que elas servem, para não fazermos nenhum, para deixarmos o céu nublado da Rondo ONZ e o schabowy para trás e substituirmo-los pela claridade da Rotunda do Fórum e por carapaus assados. Se quiserem (e se puderem) seguir o meu exemplo, puxem duma cadeira e façam favor. As imperiais estão fresquíssimas, zapraszam na preguiça!

sábado, 24 de julho de 2010

Ligações Algarve-Polónia

A Polónia, apesar de ser um país distante, tem mais ligações com Portugal do que podemos imaginar. Principalmente com o Algarve, datadas do séc. XVIII e através da curiosa história do luso-polaco José Carlos Conrado Chelmicki, ou na versão original, Józef Konrad Chełmicki.

Filho de um juíz e nascido em Varsóvia em 1813, este senhor participou no Levantamento que culminou a contestação contra a partição da Polónia e o domínio russo à época. Após a morte do seu pai em 1832 e do esmagamento da insurreição, Chelmicki exilou-se na França onde se especializou em engenharia e desenho sendo recrutado para uma legião polaca que preparava uma expedição ao Egito porém, como essa expedição fracassasse, Chelmicki decidiu alistar-se nas tropas governamentais que lutavam na Guerra Civil Portuguesa. Finda a guerra Chelmicki serviu ao lado da Rainha Cristina de Espanha como enviado do Governo Português em resposta ao pedido de ajuda do país vizinho que se via a braços com uma das guerras Carlistas. Portugal chama-o novamente para o combate em mais uma guerra entre pedristas e miguelistas e Chelmicki mantém-se leal a D. Maria até o término da guerra quando foi nomeado inspetor de estradas e pontes das províncias do Sul na sequência da construção de estradas, ferrovias e pontes nas regiões do Alentejo e Algarve até ser promovido a inspetor de edifícios públicos e monumentos de todo o país. Chelmicki foi também o autor das Cartas do Arquipélago de Cabo Verde e da Guiné onde viveu durante um ano.

Na seguinte vintena de anos José Chelmicki voltou para o exército português com a patente de coronel-inspetor de engenharia militar nas províncias do norte e foi membro da comissão de elaboração de planos para as fortificações de Lisboa. Alguns anos mais tarde visitou os ministros da guerra de França, Alemanha e Áustria fazendo relatórios sobre a construção de quartéis, fortalezas e hospitais militares ao mesmo tempo que preparava uma obra importante na história militar portuguesa: Esboço sobre a Defeza de Portugal – impresso em 1878. Chegou ao posto de Comandante-Militar do Algarve e permaneceu em Tavira até ter sido transferido em 1880 para Elvas onde se aposentou oito anos mais tarde. No entretanto a sua filha casou com um tavirense e essa foi uma razão primordial para que Chelmicki tivesse decidido voltar à cidade do Gilão para acabar os seus dias em 1890 e lá ser sepultado. Este ano Tavira vai dar o seu nome a uma das suas ruas.

Apesar de se ter naturalizado português e de ter passado mais de meio século ao serviço do Estado Português, Chelmicki nunca renegou a sua origem polaca. O seu filho estudou na escola polaca de Batignolles, arredores de Paris.

Agradecimento especial a Carlos Simões pela documentação enviada.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Ainda (e sempre) Smoleńsk

SNC00128 Este recente artigo de Ricardo Taipa vem a propósito do que senti quando entrei na estação de metropolitano do meu bairro e constatei que, apesar de já terem passado mais de três meses do acidente que vitimou o ex-presidente Lech Kaczyński, a sua esposa e um número de individualidades do país, ainda há cartazes que testemunham a lembrança que os polacos têm da queda do avião através da afixação da data do acidente e da frase “Lembrar-nos-emos” em ponto grande num fundo que simula a bandeira polaca em tons de luto. Por outras palavras, quase 100 dias depois da morte de Kaczyński e já depois de outro presidente ter sido eleito, mantêm-se os sinais que recordam o sucedido.

Os polacos gostam de mártrires e de histórias com finais tristes, adoram transformar um sofredor num símbolo de resistência ou num emblema da pátria e temos provas concretas nestes dois exemplos. A cruz de madeira erguida pelos escoteiros dias depois do acidente e que ninguém ousa tocar e os cartazes do metro, velhos e ultrapassados pelos acoontecimentos políticos recentes, colocados pelo Instituto de Publicidade Exterior. Parecem-me excessivas ambas as formas de fazer lembrar às pessoas que o presidente Kaczyński morreu eu circunstâncias trágicas mas esta é uma oportunidade de ouro de fazer renascer o caráter sofrido do povo polaco e de criar novos símbolos patrióticos em torno duma tragédia, oportunidade essa alicercada numa palavra importante que se ergue nestas alturas e que se faz sentir como um trovão: A voz da Igreja católica. O que eles disserem é (quase) lei e no caso da cruz colocada no Largo de Pilsudski a Igreja é totalmente a favor da manutenção do memorial para que a população possa ter um local de romaria e de homenagem às vítimas de Smoleńsk, o que divide a opinião pública entre os que entendem ser tempo de o país fechar esse dossiê seguir caminho e aqueles que ainda sentem necessidade de lamber feridas e carpir fatalidades.

Num dos cartazes alguém escreveu “chcemy zapomnić” (queremos esquecer), penso que não é bem esquecer que a Polónia quer mas sacudir a poeira e caminhar em frente sem ficar agarrada ao passado nem ter de ficar eternamente a chorar mortos que, pelos resultados das últimas eleições presidenciais, poucas saudades deixaram. Paradoxos interessantes de analisar sob a lupa de um sociologista.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

90 minutos

Aeroporto de Bergamo, Itália. Acabo de ver que o voo FR7402 foi adiado por 90 minutos, o tempo de um jogo de futebol. Hora e meia pode ser pouco tempo na vida de uma pessoa mas se esse tempo é passado numa sala de embarque dum secundário aeroporto italiano temos duas hipóteses: Ou desesperamos pelo atraso pensando no peixe assado no forno que nos espera à mesa do almoço, o que é escusado porque o avião não vem mais cedo por causa disso, ou abrimos os olhos e vemos o que temos em volta, as lojas, as pessoas, o que elas fazem e o que dizem.

Estou sentado no chão a chular eletricidade duma tomada que encontrei na parede e tenho à minha frente duas jovens cuja nacionalidade não consigo distinguir mas que decididamente não são polacas, não preenchem os requisitos biológicos necessários para tal. Elas estendem-se no chão para descansar as pernas, não sei para onde vão mas não me admiraria que fossem até ao Algarve porque as portas de embarque vizinhas são para Roma e Billund (agradeço que me digam onde fica). Atrás ficou um check-in engraçado onde dei graças por estar de volta a um país latino – explicando, o italiano que me aceitou o saco viu que este tinha 200g a mais do que o permitido, olhou para mim, encolheu os ombros a sorrir, colou a etiqueta com as três letras mágicas FAO, desejou-me boa viagem e atirou o resto da etiqueta autocolante ao colega do balcão ao lado – e onde estupidamente me esqueci de tirar a garrafa Żołądkowa Gorzka com mel que tinha comprado no aeroporto de Varsóvia da bagagem de mão. Aí não houve simpatias latinas e o precioso licor foi mesmo para o lixo bergamasco. Cazzo! Mais ao lado uma criança dorme encostada ao colo da mãe que se esforça para não imitar o filho. Empregados de limpeza, curiosamente todos de ascendência africana, tratam de varrer o chão. Outra mulher mais à frente não aguentou a pressão de Morfeu e deitou-se nos desconfortáveis assentos de ferro da sala, quando o sono aperta até em cima de calhaus o corpo sente plumas.

Os aeroportos são mais ou menos os mesmos em toda a Europa e eu já conheço uns poucos mas um aeroporto latino é diferente, especialmente se é um aeroporto italiano. Aqui não se conversa, grita-se, gesticula-se para explicar melhor a palavra mesmo se a esta é estrangeira e incompreensível para o ouvinte. Este não é um aeroporto silencioso e monótono como o de Luton ou mínimo e frugal como o de Charleroi, é pequeno mas fervendo de sangue mediterrânico, de grinta, de cos’é?, de grazie e prego. É a última etapa antes de lançar fateixa na Praia de Faro para um mês de férias entre a minha gente, o último passo antes de voltar à terra-mãe, às origens. É o que falta antes de voltar à casa de partida, onde tudo começou e onde tenho de regressar para me regenerar e voltar a ser genuinamente eu. Faro está aqui ao lado, os hábitos do sul da Europa também e este aeroporto italiano revela-se um excelente aperitivo.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

O que é que a gente tá aqui fazendo? - 8

Pata de Veado Meio da tarde e a sauna em que se transformou a sala de aula é pouco menos que insuportável, bizarro este país em que se abre o frigorífico no verão e está mais fresco do que na rua mas que no inverno está mais calor dentro do mesmo frigorífico do que na mesma rua. Encaro o quente como uma benção, aquilo por que esperei durante cinco longo meses, algo como 150 dias de frio e escuridão durante os quais desejei estas temperaturas, devo não ser ingrato e aprender a valorizar estas condições climatéricas porque não efémeras e deixarão muitas saudades a curto termo. Pronto, não reclamo mais.

Aceito o sol e a canícula, é melhor que aceite porque daqui por três semanas começa a nevar e convém que esprema todo este sol até ao tutano. Cai-me o crómio para níveis perigosos porque me arde o estômago de fome, aparecem-me apetites de coisas doces, bolos com creme e leite gelado. Epá!, uma pata de veado agora partia o mar todo!

Mas não. Estou rodeado por um Subway, um MacDonald’s, uma pizaria e um restaurante de comida polaca. Não há pastelarias como as que nósUcal temos em Portugal, de bolos frescos e doces porque aqui os bolos são  secos e não tão doces. O sernik, bolo de queijo, é a coisa mais parecida a um bolinho português mas não é o mesmo que um mil-folhas ou que uma lula. Os croissants têm recheio de ovos e amêndoa porque vêm sempre com aqueles sabores silvestres tipo amora ou groselha negra, paladares que me arrepiam os dentes. Sabores ferozes, para mim irritantes e pouco suaves comparados com o creme de ovos das deliciosas Bolas de Berlim da fábrica em Faro ou da baunilha que aromatiza tantas sobremesas portuguesas.

Vou ao supermercado mais próximo e compro um folhado de cereja e um pastel de ameixa, mais frutas que não vêm nos almanaques da doçaria portuguesa. Senhores, o bem que eu pagava por uma pata de veado agora e um Ucal fresquinho! Mesmo no verão, mesmo com os encantos que Varsóvia debita em tempo estival, há coisas que (não) acontecem e que me fazem pensar por vezes…

domingo, 11 de julho de 2010

Dona Polónia e os Seus Vizinhos, vol. 1 - República Checa

Absinto As sete fronteiras da Polónia originam a que tenha muitos vizinhos diferentes, consequentemente muitos povos com mentalidades diferentes. A história ensinou-nos da relação difícil que a Polónia manteve com alguns dos seus vizinhos, mais concretamente a Alemanha e a Rússia / URSS, e das constantes disputas territoriais e políticas que o povo polaco teve de suportar. Hoje em dia as relações são muito menos tensas do que há 60 anos atrás mesmo que haja sempre algum ressentimento, prova disso foi a alegria com que os polacos celebraram o golo de Puyol na meia-final do Mundial no bar onde eu devia ser a única alma a desejar a vitória da Mannschaft. Marcas que as guerras deixaram e que demorarão algum tempo até serem completamente (se é que algum dia serão) apagadas.

Reza a lenda que a Polónia foi criada por um jovem eslavo chamado Lech que tinha dois irmãos: Ćech e Ruś. Um dia estes três irmãos saíram de casa para conquistar terras, Ćech fundou a República Checa, Ruś caminhou mais até encontrar terreno para criar a Rússia e Lech andou até descobrir um ninho de águias. Lech terá considerado esse ninho como um sinal dos deuses e decidiu que aí, mais concretamente em Gniezno, seria a Polónia. A escolha do local está certamente entre as dez piores decisões da História pois sendo a Polónia uma terra plana e de curtos vales é um território ideal para servir de teatro de guerra aos invasores por não dispor de acidentes naturais que sirvam de trincheira ou esconderijo para os indígenas. Por isso Hitler quis fazer o corredor ferroviário Berlim-Moscovo através da Polónia e transformar Varsóvia num apeadeiro. Por isso também é que a Polónia já foi disputada por virtualmente todos os países europeus (hoje mais através do investimento de capital e das manobras da NATO), inclusive pela Suécia que nunca fez mal a ninguém, até ter passado um período da sua história como inexistente por 123 anos a partir de 1795. Por essas e por outras é que todos conhecem a animosidade que os polacos têm para com os russos, recentemente avivada depois do episódio de Smoleńsk no qual se aventaram de novo as teorias de que Moscovo estaria por trás de novo banho de sangue polaco. No entanto é interessante olhar para a relação que os polacos têm com o seus restantes primos eslavos, como os checos.

Para os polacos os checos são como um irmão mais novo ligeiramente tolinho e demasiado liberal e descontraído, eles são viciados em hóquei no gelo e não ligam muito aos saltos de esqui como na Polónia. Um checo só se preocupa com a sua cervejinha e com levar o dia-a-dia da forma mais tranquila possível porque não tem espírito de combatente. O checo fala uma linguagem divertida, parece-se um pouco com a língua certa (polaco) mas tem palavras estranhas e pronúncia algo infantil. O polaco não perdoa a atitude checa perante a invasão Nazi pois enquanto os polacos se juntaram e lutaram até ao último suspiro os checos renderam-se sem resistência – sem derramamento de sangue nem destruição de cidades – mas, no ponto de vista polaco, sem honra. Não lutaram pela sua pátria, não defenderam a sua identidade, limitaram a abrir as pernas para o invasor germânico. A Checoslováquia estava descansadinha no seu bar a beber a sua caneca quando os nazis irromperam. O checo, antevendo a inevitável prisão, perguntou fleumaticamente se podia ao menos acabar a Staropramen. O polaco não compreende isto, não percebe porque o checo não se levantou imediatamente a gritar palavrões contra os “porcos nazis” e não reuniu um grupo de insurrectos para dar cabo da cabeça aos alemães, provavelmente um grupo cuja resistência duraria até à primeira bala ser disparada. O checo não quis morrer inutilmente e adoptou uma postura de resistência silenciosa.

Ilustrativa é a cena duma comédia checa que retrata Praga no tempo da ocupação nazi, num restaurante de luxo onde trabalhava um chefe-de-sala que falava 7 idiomas diferentes como francês, japonês, inglês, alemão, etc. Os nazis apoderaram-se do restaurante mantendo o staff pois estes eram fundamentais na forma como a casa funcionava, Símbolos checos incluindo o mencionado chefe-de-sala, peão imprescindível no atendimento ao cliente. Certo dia entra um oficial alemão no restaurante, senta-se à mesa e dirige-se ao dito funcionário fazendo o pedido em alemão. O empregado finge não perceber e o nazi muda o registo para francês seguida de novo sinal de ignorância por parte do chefe-de-sala. O alemão, enervado, faz o pedido em mais duas ou três línguas diferentes sempre recebido com mostras de desconhecimento. Finalmente o oficial nazi diz que não sabe falar checo. Aí, fleumático, o empregado de mesa checo encolhe os ombros e afasta-se da mesa deixando o germânico a falar sozinho.

No entanto os polacos têm boas relações com os vizinhos checos e mesmo com os eslovacos, não fazendo muita distinção entre uns e outros. Para o polaco, checo e eslovaco é checoslovaco, farinha do mesmo saco e com pouco que os diferencie mas são povos que se dão bem. O mesmo não acontece com os bielorrussos ou ucranianos, tema sobre o qual escreverei em breve.

As miúdas? Nisso a Polónia é uma super-potência, esqueçam o resto…

quarta-feira, 7 de julho de 2010

III – Do amor

Ah, o fogo que arde sem se ver…

Ia escrever no texto anterior algumas linhas sobre amor à camisola mas deixei isso para aqueles que ainda acreditam no Coelhinho da Páscoa. Hoje em dia há amor ao cifrão, amor à camisola é o caso de Abdón Porte, um defesa uruguaio do Nacional de Montevideo que preferiu suicidar-se aos 37 anos em pleno grande círculo do seu estádio do que passar pela desonra de perder a titularidade do seu amado clube. É difícil catalogar um amor, se é um amor profundo, verdadeiro ou um amor superficial e passageiro. Eu próprio não tenho muito à-vontade (nem moral) para dissertar sobre o tema mas posso tentar destrinçar o novelo à luz da entrada anterior que é a deixa para esta, vou tentar explicar o que é o amor, segundo a minha doutrina, usando três exemplos.

O amor à família – Como a minha tia e a minha mãe que são as pessoas mais importantes no meu sangue, agora que o meu tio já não está entre nós. O amor que sinto por essas pessoas tão especiais é o amor próprio de alguém que está contente com o resultado que essas pessoas tiveram no meu processo de educação como ser humano, no seu jeito às vezes atabalhoado de mulheres algarvias. Foram mulheres que tentaram no melhor das suas capacidades fazer de mim uma pessoa boa, de bons valores e de moral. Não me considero um patife e creio que essa opinião é consensual entre as pessoas que comigo convivem passe alguma imodéstia. Ou seja, o produto das suas ações de educação é positivo, fizeram de mim um homem que tem algum capital de simpatia entre os seus pares, um tipo fixe e honesto que não mistura o cinzento com o branco e preto. Prezo a verticalidade da minha espinha, a minha coerência e se há alguém a quem o devo será a esse par de mulheres. A minha paga? Amá-las. Não posso dar mais mas sei que elas não querem mais que isso.

O amor ao parceiro – Ou à parceira, no meu caso porque eu não gramo nada paneleiragem. Chamem-me preconceituoso ou homofóbico porque eu também tenho de ter defeitos mas tenho amigos negros, ciganos, brasileiros, talvez judeus, certamente entre imigrantes do Leste e dou-me bem com toda a gente, joguei 20 anos futebol com eles, abracei colegas em tempos de vitórias e chorei com eles as nossas derrotas. Porém rabetas é coisa que sempre me repugnou e quero distância de apreciadores de enguias cruas porquanto sou hetero e o amor do meu parceiro equivale a dizer “o amor da minha namorada”. Descobri que esse amor não é o que alguns dizem, que cega as pessoas, que nos arrebata e nos deixa vulneráveis aos encanto dos outros. Nada disso. Esse tipo de amor é tranquilo e discreto, vai conquistando palmo a palmo como a maré que enche e inunda o sapal até se instalar definitivamente, ramificado, consolidado. Esse amor é incolor e inodoro, sabemos que está presente mas não o conseguimos verbalizar porque é um bem-estar absoluto e as coisas absolutas são difíceis de explicar. Não precisamos de o mencionar constantemente, de o comprovar, de o mostrar. Ele é, simplesmente, o amor. Está no sítio dele que ele tem só para si, mais nada o ocupa e nada o ameaça. É tão imenso que se ri dos que lhe querem fazer mal, dos que pensam que o podem atingir, é tão grande quanto a mais alta montanha mas pesa tanto quanto o mais singelo floco de neve. Este é o amor que tenho pela minha namorada, um amor diferente mas igualmente sério e importante. Não é maior nem menor, apenas diferente, talvez complementar.

O amor ao clube – Aqui todas as teorias caem por terra pois este é um amor totalmente irracional e que não obecede a nenhum padrão. O amor que eu tenho pelo meu Sporting deve ser igual ao que muitos têm pelo FC Porto ou por outro clube qualquer, foge às definições académicas e tem regras próprias. É um amor que extasia e empolga os sentidos porque catalisa emoções, tem pouco de razão e não procura explicações no campo da teoria. É um amor constante, militante e necessariamente praticante que é feito de gritos e cigarros, de socos no sofá e peles roídas, de esperanças e frustrações. É vulcânico nos momentos de raiva e refrescante nos triunfos, tanto eleva os protagonistas ao Olimpo num segundo como os lança nos dentes de Cérbero. O amor que tenho pelo Sporting é comum e transversal ao das crianças que jogavam comigo à bola na Escola do Carmo nos anos 80 e que sofreram com a seca de 18 anos mantendo-se fiéis e estóicos na sua convicção que um dia iríamos vencer, esse amor que rebentou naquele 14 de Maio de 2000 quando André Cruz, Ayew e Duscher deram corpo a um sonho, quando tudo fez sentido, quando amigões como o Toni, o Artur, o Giga, o Cartaxo e o Lino entre outros abraçaram-se comungando lágrimas e gargalhadas, o amor a uma facção, a uma cor, a um princípio. Este amor, embora não requeira correspondência, nunca será traído porque recrudesce nos momentos difíceis. Este amor não conhece condições nem tem alíneas, é um contrato unilateral que consiste em duas palavras: “até morrer”. Este amor nada me dá mas eu tudo lhe dou e mais daria se mais tivesse, é um amor a fundo perdido, infinito e perpétuo. Tenho sempre enorme dificuldade em traduzir o frémito que sinto quando vejo o Leão Verde, como quando voei com a Ewa perto de Alvalade há 3 semanas ou quando se aproxima um jogo, é irracional, primário, animalesco. Talvez se consiga resumir com “é o Sporting!”, e o Sporting é o nosso grande amor.

Em Agosto vou a Alvalade com a minha namorada e vou para lhe apresentar o Sporting, para lhe apresentar o meu grande amor, para que ela me consiga compreender, para que consiga perceber a minha natureza e conhecer o fenómeno, para presenciar Alvalade ao rubro. Se ela não conseguir, se ela não se emocionar nem se sensibilizar… Não faz mal, para o amor há sempre lugar.

terça-feira, 6 de julho de 2010

II – Das maçãs podres

Moutinho A Nação Sportinguista viveu um tsunami emocional depois de se anunciada a transferência do ex-capitão João Moutinho para o FC Porto, eu próprio fiquei admirado com a venda do jogador, perdão, do ativo da SAD para um clube, perdão, uma SAD rival e procurei conhecer os contornos do episódio no sentido de encontrar algo que justificasse a aparente impavidez com que o negócio foi feito pelos responsáveis sportinguistas. Mediante o que veio a público, considero que o Sporting fez um bom negócio e vendeu bem.

Desde há algumas épocas que João Moutinho tinha revelado vontade em sair do Sporting, mesmo após os leões terem renovado e substancialmente melhorado o contrato do jogador passando este a auferir €90.000,00 por mês sendo o jogador melhor pago do plantel a par de Liedson. Esta engorda do bolo salarial não foi suficiente para Moutinho (fontes algarvias dizem que a sua escola de futebol está a dar prejuízo e por isso ele forçou a saída para o Everton) e depois de uma temporada medíocre, tal como todos os seus companheiros de equipa, da consequente desvalorização e esperada ausência do Mundial da África do Sul – onde ele também não se iria valorizar – surgiu a notícia duma eventual despromoção de capitão de equipa, uma situação que a concretizar-se só pecaria por ser tardia. Aqui e perante os silêncios (coniventes?) de Costinha e Paulo Sérgio a paciência do jogador acabou, ele perdeu a cabeça e exigiu ser transferido fosse para onde fosse. Isto é uma atitude própria de quem está farto, de quem já não quer mais, de quem não está com a concentração focada nos problemas que interessam a uma equipa de futebol. João Moutinho estava no Sporting contrariado, queria sair e queria sair imediatamente.

 

Assim a solução encontrada foi relativamente lógica. Ofereceu-se o jogador, propôs-se uma importância (aqui as cláusulas de rescisão têm um valor meramente referencial pois ninguém iria dar 20 milhões por um jogador que não aparece há 2 anos) e fez-se um negócio por 11 milhões, um valor bem abaixo da dita cláusula mas que me parece ainda assim interessante pelos motivos acima mencionados. Foi um excelente negócio? Não porque o último excelente negócio que o Sporting fez foi a venda de Nani e hoje em dia já não se pagam 5 milhões de contos por jovens promessas, mas foi o negócio possível e por números nada desprezíveis além de que ficamos com Nuno André Coelho, um rapaz no qual até há uma certa fé. Todos ficaram contentes. O Sporting livrou-se de um jogador que era mais problema que solução e ainda embolsou um simpático maço de notas, o FC Porto contratou um jogador que já cobiçava há anos e o próprio jogador mudou de ares como pretendia

Não se deve lamentar a saída de Moutinho porque só fazem falta os que se envolvem inteiramente nas coisas, os que abraçam incondicionalmente as causas e os que encarnam ideais sem restrições. Moutinho não é um traidor, preferiu o dinheiro e revelou essa preferência há muito tempo, mantê-lo no plantel seria um desperdício de espaço, de verbas porque se lhe pagaria o salário e duma excelente oportunidade de encaixar dez milhões de euros. Não sei se o potencial futebolístico de João Moutinho melhorará no Olival mas tenho a certeza de que os cofres de Alvalade agradecem a transação, agradeço-lhe as prestações desportivas ao serviço do Sporting mas como pessoa vai deixar tantas saudades como o meu vizinho do 2º andar que nem conheço. Das pessoas pequenas nunca rezou a história e duvido que os almanaques leoninos recordem a pessoa de João Poucochinho.

I - Das eleições presidenciais

POLAND-PARLIAMENT-KOMOROWSKI A segunda volta das eleições presidenciais na Polónia determinaram Bronisław Komorowski da PO (Plataforma Cívica) como vencedor e futuro Presidente da República, um resultado que veio de encontro ao que vaticinavam as sondagens efetuadas à boca das urnas que apontavam o candidado liberal como obtendo aproximadamente 53% dos votos contra 47% do conservador Jarosław Kaczyński. Esta votação apanha-me um pouco de surpresa pois eu esperava uma maior votação no PiS (Kaczyński) por três motivos: Primeiro, porque nenhum dos candidatos afastados na primeira volta expressou publicamente o seu apoio em nenhum dos dois candidatos finalistas; Segundo, porque a segunda volta das eleições foi marcada para o primeiro fim de semana de julho que é a altura em que muitos polacos entram de férias, consequentemente abandonam as cidades onde moram, e que coincidiu com o evento Open’Er – um Festival do Sudoeste à polaca e que teoricamente prejudicaria Komorowski na medida em que a base de apoio deste reside precisamente na população jovem e urbana em oposição ao eleitorado de Kaczyński, mais idoso e concentrado no Leste rural como podemos ver na ilustração abaixo, que é mais disciplinado e não falha nos momentos de mobilização; Terceiro e último, o voto por comiseração, por solidariedade, pelo luto do gémeo que morreu em prol da Pátria.

Os meus medos não se concretizaram e a Polónia assistiu ao completar  da viragem ao centro, uma boa notícia para os investidores estrangeiros que receavam as posições anti-europeias do PiSMapa de votação e que faziam figas para que a PO ganhasse mas também para os polacos modernos e pró-europeus que não quiseram ficar refém duma conjuntura em que o Poder da Igreja fosse maior do que o Poder do Estado e assinaram o decreto que põe fim à Era-Kaczyński. Apesar duma taxa de abstenção cifrada em 45% (quase metade dos cidadãos eleitores) os votantes deram carta branca ao partido liberal para gerir os destinos da Polónia uma vez que Presidente e Primeiro-Ministro falam a mesma linguagem. O futuro parece agora mais risonho para o maior país da Europa Central devido à sua prevista convergência de políticas comuns com os parceiros da União Europeia como a França cujo presidente Sarkozy já convidou Komorowski a visitar o Eliseu “tão brevemente quanto possível”, vamos ver se as expectativas se confirmam e se a Polónia dá o tão ansiado pulo qualitativo que tem prometido.