terça-feira, 10 de novembro de 2009

Atrás do Muro, em bicos de pé

Depois das comemorações do 20º aniversário do derrube do Muro de Berlim, acho interessante deitar um olhar polaco sobre os acontecimentos e também sobre a cerimónia que teve Lech Wałęsa como um dos protagonistas.

guerra fria Há 20 anos atrás vivíamos no tempo da Guerra Fria iniciada depois do fim da 2ª Guerra Mundial, sob permanente ameaça dum conflito nuclear entre as duas superpotências da altura, URSS e EUA, que prometiam destruírem-se mutuamente e arrastarem o resto do planeta devido a imensas questões políticas como a Crise dos Mísseis em Cuba. Guerras como a da Coreia, o Vietname e o Afeganistão polarizaram o mundo entre Pacto de Varsóvia e NATO e cada um dos beligerantes tentava expandir a sua esfera de influência em todos os continentes. A Europa estava dividida entre Ocidente e Leste – onde a Polónia se encontrava.

Em 1978 o Vaticano elege João Paulo II como papa, uma eleição que muitos qualificam como política porque, tendo em conta que não passava pela cabeça de ninguém um papa oriundo de um país oficialmente socialista, o gesto só podia ser interpretado como uma tentativa de fortalecer o ânimo do povo polaco, tradicionalmente católico e anti-soviético, na sua resistência contra o avanço do comunismo e respetivo ateísmo na Europa. Esta eleição teve algo de profético pois nos anos segiuntes rebentam alguns episódios que levam a Guerra Fria a novo apogeu, a saber:
  • Invasão do Afeganistão por parte da URSS e resposta dos EUA armando e treinando os Mujahidin (futuros Talibã);
  • Venda de armas a Saddam Hussein em plena guerra Irão – Iraque;
  • Guerra das Estrelas, a corrida espacial;
  • Eleição de Margaret Thatcher como primeira-ministro britânica, duramente conservadora e ferozmente agressiva para com Moscovo.

Muro brandenburg Entretanto o regime soviético dava mostras de alguma incapacidade de lidar com as insurreições que se sucediam nas suas repúblicas satélite além de que a baixa produtividade dos seus trabalhadores aliados aos elevados gastos duma gigantesca máquina burocrática e militar corroíam irremediavelmente o seu condenado sistema económico. Moscovo não conseguia intervir por ter moeda fraca, o PIB era metade do dos EUA, todas as decisões estratégicas e sociais era emperradas pela burocracia e perdia-se tempo na tomada de decisões. Para piorar o cenário deu-se o desastre na central nuclear ucraniana de Chernobyl que libertou 400X mais radioatividade do que a bomba de Hiroshima e destruiu por completo a colheita de cereais desse ano (note-se que os cereais constituíam a principal exportação soviética nesse tempo), aniquilando importantes receitas financeiras para o Kremlin. Em meados da década de 80 os países da Cortina de Ferro começam a reagir contra a repressão soviética, a Hungria, Checoslováquia e Bulgária negociavam eleições livre enquanto na Roménia perseguia-se Ceaucescu para matar de vez o comunismo naquele país. Na Polónia, o Solidariedade não dava tréguas ao enfraquecido governo do general Jaruzełski contando com a oficiosa colaboração do Vaticano na pessoa do compatriota Karol Wojtyła e alcançava uma importante vitória na mesa-redonda de 89, o primeiromapa guerra fria europa passo duma irreversível caminhada para a democracia na Polónia.Inspirados pela sublevação dos países orientais e pelas dramáticas e constantes tentativas de êxodo da RDA, os países bálticos (Lituânia, Letónia e Estónia) reivindicaram independência da URSS, Wałęsa foi indigitado Presidente da República e Mikhail Gorbachov agarrava-se desesperadamente às novas políticas de Perestroika e Glasnost para salvar o decrépito regime tendo apenas conseguindo-se salvar dum golpe de estado. A RDA preparava a normalização de relações diplomáticas com a vizinha RFA quando se deu “O Erro de Schabowski”, uma gafe que mudou o mundo.

20 anos depois, Wałęsa foi convidado para empurrar as peças que simbolizam o desmoronar do comunismo na Europa e é de elementar justiça que ele tenha sido escolhido para tão simbólico gesto porque, apesar de já não ter qualquer protagonismo na política moderna da Polónia, a Europa e o País não o esquece como o eletricista tenaz que ousou enfrentar o gigante soviético e que tirou a sua nação do jugo comunista que a asfixiava. A Polónia orgulha-se do papel relevante que dois homens polacos tiveram na redefinição do mapa político mundial, um papel de verdadeiro protagonismo em oposição ao imbecil estrelato que um cretino tentou reclamar.

É a tal coisa, enquanto uns têm motivos para se sentarem no Muro e não o fazem outros saltam por detrás dele para que alguém os note. Também por isso continuamos pequeninos.

1 comentário:

Ryan disse...

Concordo com a tua crónica sobre um dos momentos marcantes da história recente no mundo. O muro caíu e por causa disso estamos nós por cá a viver.
Waleza tem todo o mérito e crédito que os livros, média e história lhe dão. Acho que por vezes exagerado mas mesmo assim ele foi dos políticos que mais contribuiu. Obviamente os Americanos têm de ser contados nesta história e todo o mundo ocidental. Não esqueçamos Gorabachev. O toque final para a queda desse pedaço de engenharia soviético foi graças ao regime que se achava ja perdido no meio de uma guerra economica que levava grande desvantagem.