terça-feira, 30 de setembro de 2008

Um rio, duas cidades

Varsóvia é uma cidade divida pelo rio Wisła e essa divisão não é apenas física. É uma divisão temporal, social e cultural.

Na margem esquerda (ocidental) do rio, existe a Varsóvia moderna que aparece nas bancas da imprensa. Uma cidade à procura do tempo perdido, de imponentes arranha-céus e apartamentos luxuosos, de hotéis caros e escritórios multinacionais, do corre-corre atrás duma reunião de negócios ou do fechamento de mais um contrato. Uma urbe erguida sobre as ruínas deixadas pelos nazis e posteriormente redesenhada por Estalin24082008(003). Não sobrou nada a oeste do Wisła, Hitler arrasou a cidade e o que se seguiu foi a implementação do estilo realista e pragmático dos soviéticos com a construção de vários blocos de apartamentos pequenos e iguais para que o povo polaco não pudésse ter hipóteses de ambicionar a algo mais. O bairro onde vivo é uma boa prova disso - na mesma freguesia (Ursynów) tenho o choque visual produzido pelos bloki de inspiração russa e os condomínios novos da minha vizinhança, isto tudo entre três paragens de metropolitano.

A margem direita preserva, no meu entender, a verdadeira identidade varsoviana, o último reduto da cultura desta cidade. Praga é um lugar diferente onde se respira um ar mais pesado, nota-se que as pessoas não são iguais às que trabalham no Centro ou nos escritórios espelhados de Służewiec. É gente curtida pelo tempo, pelas agruras dum Inverno que parece mais frio nesta margem Leste. Praga esteve ocupada pelas tropas soviéticas, o Exército Vermelho que assistiu a 300 m, impávido, ao extermínio das forças polacas às mãos suásticas enquanto era suposto ir em seu socorro. Neste lado do rio não caiu um grama de chumbo alemão, os ministérios e organismos públicos funcionaram em Praga enquanto Varsóvia prosseguia a sua reconstrução, os prédios e fábricas mantiveram-se de pé e foram contando as suas estórias terríveis aos habitantes. A linha arquitectónica parou no tempo, os edifícios são escuros e corroídos pela acidez das intempéries. As esquinas guardam vendedores ambulantes que enxotam os clientes com baforadas densas de tabaco. Os elétricos são mais antigos do que no lado de lá, as igrejas também, os passeios trazem os adeptos do Legia - os mais violentos do país. Aqui está o estádio Dziesięciolecia (Estádio do 10º Aniversário), construído com o entulho resultante da Insurreição de Varsóvia,  que será convertido no novo Estádio Nacional. Aqui sentimo-nos realmente na Europa de Leste, na República Popular da Polónia.

Tal24082008(005)vez por terem ouvido os horrores contados pelas pedras da calçada as pessoas de Praga são mais fechadas e de ar mais rude. Talvez por isso os ultras gritam "Warszawa jest tylko Legia" (Varsóvia é apenas / toda Legia). Talvez por o dinheiro e o poder de compra não terem atravessado a ponte Śląsko-Dąbrowski as roupas e os carros não são tão actuais e potentes como na outra margem. Talvez por isso eu tenha visto este sinal à porta dum centro comercial de Praga Północ.  24082008(002)

domingo, 28 de setembro de 2008

Primeiro capítulo

Seguindo a tradição polaca, ontem foi dia de parapetówka, uma festa que tem lugar sempre que se compra ou se arrenda casa. Já era hora de organizar uma borga com os amigos em casa para apresentar-lhe o meu lar, um cantinho onde a portugalidade se fará notar em detalhes (bandeira, cachecóis, azeite, sport tv) e que estará sempre desponível para uma boa farra.

Foi um prazer receber muitos daqueles que transformaram a minha vida nestes últimos 10 meses de Varsóvia, pessoas que receberam-me como um deles e puseram toda a sua disponibilidade e simpatia ao meu serviço para que me adaptásse o melhor possível. Nesta Babel de gente oriunda de vários países notei com curiosidade que não havia polacos, tipo género masculino. Havia gente do Brasil, EUA, Perú, Bielorrúsia, Inglaterra, Venezuela, Portugal mas os representantes da Polónia eram todos do sexo feminino. Foram convidadas raparigas e respectivos namorados mas foi com espanto que recebi as confirmações das suas presenças apenas individuais, alegando que "eu não quero que o meu namorado vá". Já estou há quase um ano neste país e só conheço dois polacos, não percebo porquê. Enfim, adiante.

Foi uma party à antiga portuguesa com todos os ingredientes que um bom tuga que se preze gosta de ter: Comes e bebes (mais bebes que comes, claro), gajas boas com fartura, música, o segurança do condomínio a vir avisar duas vezes do granel que se estava a fazer, bebedeiras engraçadas, cenas entornadas no chão e a bófia a fechar a tenda às 2:30 da matina porque a vizinha do 2º andar reclamou - eu moro no 5º e último andar.

Daí que estou esperançado que este tenha sido o primeiro de muitos memoráveis (ou como se diz na minha terra, inolvidáveis) momentos neste canto de Varsóvia. A ver o que o futuro me reserva.

As fotos serão publicadas nas devidas estâncias, Hi5 ou Facebook.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Alvorada!

©2006 Michal Zaleski Finalmente foi instalada internet na minha casa. O Zé referiu no post anterior que a internet é um bem de primeira necessidade no mundo moderno, tal como são as roupas e o calçado. Um homem sem poder recorrer às "autoestradas da informação" está desprotegido contra as intempéries da ignorância e do desconhecimento, ainda por cima quando está longe da terra natal.

Passei dias difíceis por não ter como passar a mensagem ao mundo. É complicado ter coisas para dizer e estar impedido de o fazer, sobretudo quando se é alguém que tem prazer em comunicar como é o meu caso. Por fim o tempo das vacas silenciosas terminou e este espaço voltará a ter a dinâmica habitual, talvez até mais acelerada pelas estórias acumuladas entretanto. O blogue não morreu até porque, como disse Lord Palmerston,

"Morrer, meu velho, é a última coisa que tenciono fazer!"

Sendo assim, continuemos q:)

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Mudança de estação

Já é Outono, este ano isto começa cedo!

Vai começar a temporada da hibernação e eu ainda sem net em casa »:(

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

A propósito do idioma polaco

"Polish was created by God when He dropped his Scrabble box" - Norman Davies

"O Polaco foi inventado por Deus quando Ele deixou cair a sua caixa do Scrabble"

Correcto e afirmativo!

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Calma, respirem...

Não, não morri.
Não tenho é internet em casa, é um imbróglio do camano que escuso-me a descrever. Estou dependente das ligações que a escola possui e não posso dar-me ao luxo de tomar tempo para escrevinhar as minhas memórias porque há sempre gente na fila.
Vou ter de aguentar-me à bronca enquanto a ex-inquilina do meu apartamento não resolve a situação e sabendo como os polacos tratam dos serviços ao cliente bem posso ir esperando sentado.

Fónix!

terça-feira, 9 de setembro de 2008

É aqui q:D


A vida dá algumas voltas. Quando tinha tudo planeado, combinado e quase assinado para ir morar para Wola surgiu uma oportunidade de visitar um apartamento em Natolin no extremo sul da cidade. Não foi coisa que me seduzisse, ter de viver a 12 km do trabalho (sempre dentro de Varsóvia) e passar um quarto de hora no metro mas houve factores que me cativaram imediatamente naquele apartamento. A saber:
  • A localização, voltado para sudoeste, ideal para a instalação da parabólica para apanhar notícias e futebol de Portugal. É boa para apanhar solinho e para poupar no aquecimento central;
  • A proximidade dum Tesco aberto 24h por dia, mesmo bom para ir às compras a altas horas ou no caso de que o papel higiénico se acabe derrepentemente;
  • A oxigenação dos pulmões proporcionada pelos passeios de bicicleta desde já antevistos no Park Natoliński;
  • A área (60m2) substancialmente maior que a do outro por uma renda um pouco superior uma varanda desenhada especialmente para grandes petiscadas na Primavera e para guardar a bicla mencionada no ponto anterior;
Assim que ficam desde já convidados a visitar este espaço dedicado à cultura luso-algarvia onde imperará o relaxe e a descontracção. Não se esqueçam é de trazer algo que se coma.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

O blogue em tons de Asul

Figurar em tão ilustre lista ao lado de tão importante gente só pode me dar gabo e aumenta a fasquia da qualidade deste blogue.

Infelizmente ando com a cabeça a mil à hora por causa da mudança e dos respectivos preparativos, daí não ter como (leia-se computador) para dar-vos notícias. Sempre informo que a inauguração oficial do novo covil tem como data oficiosa 27 de Setembro, precisamente a data do dérbi.

Aí verei o que me trará a nova casa de novo :)

ps - O Presidente já abalou para Cracóvia. Quem me dera a mim...

terça-feira, 2 de setembro de 2008

O Presidente na Polónia

A visita de Cavaco Silva à Polónia pode ser um bom veículo de promoção da nossa imagem neste país e um importante contributo para que Varsóvia não se sinta só no perigoso braço-de-ferro que trava com a Rússia a propósito da questão do Cáucaso. A Polónia necessita de apoios sólidos e eloquentes pois tenho algumas reservas em relação ao comportamento que Moscovo poderá ter sobre a Polónia, se recordarmos que o governo polaco garantiu imediato e incondicional apoio à Geórgia no conflito travado com o poderoso adversário e que recentemente assinou o documento que permitirá aos EUA a construção dum escudo anti-míssil algures no seu território. Todas estas acções foram consideradas pelo Kremlin como "impertinentes provocações" e não ficaria admirado se a Rússia optásse pelo caminho fácil da represália, precisamente onde ela dá cartas nesta parte do mundo: O gás.

Vem aí o Inverno e as temperaturas baixam drasticamente como é do domínio público. O gás russo é fundamental para aquecer os lares polacos, tanto Moscovo como Varsóvia sabem disso, e esse é que é o problema que realmente me aflige. Não tanto o formidável desempenho das empresas portuguesas na Polónia nem a óptima imagem que o nosso país tem perante os polacos. Francamente, preocupa-me mais a crescente onda de criminalidade violenta e car-jacking que assola o nosso país do que os pornográficos lucros de qualquer Millennium polaco ou português. Dá-me mais que pensar a teimosa lei estúpida que obriga (?) os magistrados a libertar criminosos que as polícias tão arduamente perseguiram e capturaram.

Eu, enquanto trabalhador e residente na Polónia, congratulo-me com a visita do meu Presidente e com a força que certamente trará às relações e cooperação entre os dois países. Como Português acima de tudo, preocupo-me com a minha gente porque não os sinto seguros. Continuamos a ser craques em política externa (Tratado de Lisboa, Cimeira Euro-Africana, Comissão Europeia, Comissão para os Refugiados) mas para cuidar do nosso jardim à beira-mar plantado somos uma vergonha. E como tenho de trabalhar, se calhar só terei tempo de visitar a cerimónia no Monumento ao Soldado Desconhecido que fica a dois quarteirões do emprego.

Mesmo assim, ainda não sei.