Quem não se recorda dos filmes que tinham vencido festivais de animação em Zagreb e Bucareste? Riscos e sarrazinas que não divertiam nada. Bonecos disformes de falas idiotas que desesperavam a criança mais paciente mas que tinham sido laureados na última Mostra de Animação Experimental de Budapeste. Antes de sorver o Tom & Jerry, Pantera Cor-de-rosa, Bugs Bunny ou um esporádico Mickey Mouse tínhamos de aturar um pacote de filmes checoslobúlgaros sem ponta por onde se lhe pegásse. Mas não havia Youtube nem eMule na altura e a malta gramava a pastilha sem bufar.
Havia, no entanto, um ursinho de Leste que eu até curtia. Uma voz muito simpática numa linguagem amistosa, bonecos alegres e coloridos, enredos interessantes e com moral. O ursinho era tão fixe que sempre que passava o genérico da despedida eu ficava triste, também porque o senhor que cantava o tema desse genérico fazia-o numa voz tão terna que deixava-me desgostoso. Não, não era o Misha. Era o Miś Uszatek (Urso Orelhinha).
Ontem estava a zappar pelos canais polacos e aparece-me o Uszatek à frente. Fiquei grudado na tv a recordar a meninice, chocado com o facto de perceber grande parte do diálogo entre as personagens. Monólogo, aliás, porque é o "tal" senhor que faz a voz de todos os bonecos. Aqueles 6 / 7 minutos que durou o episódio foram passados em frente a uma televisão ainda a preto e branco, a comer Nestum depois dum dia de escola no Externato Farense. Teria 8 anos, o meu irmão chorava à espera da mama da mãe, os Jeovás cantavam enquanto eu jogava futebol na Escola do Carmo ao Domingo, o meu tio trazia lebres da caça em Espanha, a família em peso cumpria a saga do bacalhau em Ayamonte (hora e meia na 4L do meu avô pela 125). Tudo era uma festa, os tempos em que eu era feliz e não sabia.
Veio o genérico final do desenho animado e eu escondo as minhas lágrimas da Iza. Que vergonha, um homem barbudo (o frio polaco a isso obriga) a chorar por causa de bonecos! Mas a distância no tempo e no espaço deixa-nos mais sensíveis a certas impressões, rever o Uszatek a 3000 km e 30 anos de distância deitou-me abaixo. Deixa lá ver se as lágrimas não me lixam o teclado.
PS - Para quem quiser ser acometido dum severo ataque de melancolia, apenas para os nascidos na inigualável década de 70, sirvam-se do seguinte:
No País Dos Rodinhas (chaladinhaaaaa!!!) - inglês
Professor Baltazar - jugoslavo / croata
Fábulas da Floresta Verde - israelita, digo eu...
Tom Sawyer - japonês?
D'Artacão e os 3 Moscãoteiros - espanhol
O Carrossel Mágico - inglês
5 comentários:
Há 3 anos que entrei na casa dos 30 e confesso que ao ver algumas do teu blog relembro as minhas próprias vivências. Claro que me lembro desse Urso e do Tom Sawyer (que alguém me arranjou mas em francês) e de outras coisas bonitas que passavam pela TV... comparado com o que se passa agora confesso que estávamos melhores servidos apesar da cor e da qualidade do desenho não ser o que é hoje. Sim recordo com saudade desses tempos em que fazia os deveres da escola a correr para ver a animação, etc... e até também era feliz e não dava valor, ou usando as tuas palavras, não sabia. Não fujindo ao tema ainda bem que aqui pela Polónia existem satélites que nos ajudam a não estar a leste com a língua... Um abraço compadre
Olá!
Não resisti a comentar este post,tenho 30 anos e recordo-me vagamente (pq ainda era mt pequerrucha)deste amoroso ursinho,tal como tu tb via os desenhos animados com uma pratada de nestum de mel ou de chocolate no colo :) acho q todos os nascidos na decada de 70 tinham esta rotina,e sim eramos mto felizes assim!A criançada de agora nem faz ideia!O q foi feito destes ursinhos de leste,do Tom & Jerry,do Tom Sawyer,da pantera cor-de-rosa and so on?!Fico satisfeita por saber q este ursinho ainda sobrevive!
By the way,tb vivo um amor luso-polaco :) mas à distancia (eu no Porto e ele em Londres).
Joana
Agora com 38 anos, arrepio-me até à ponta dos cabelos quando oiço o genérico do miz uszatek. Espectacular.
Boa sorte na Polónia que isto cá pelo rectângulo vai de vento em popa (direito ao fundo).
MG
É pá... estou precisamente na Polónia (Varsóvia) e hoje ao ver um sinal de fim de estacionamento lembrei-me logo de tudo aquilo que falaste, mas em versão Sintra em direcção a qualquer outro sítio... chuinf, chuinf...
Ò bronco os "riscos e sarrazinas que não divertiam nada. Bonecos disformes de falas idiotas" era o melhor que o Vasco passava. Vai mas é ler 1 livro e larga a RTP Internacional.
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