Com a entrada em vigor da nova lei que proíbe fumar em locais públicos têm surgido reações provenientes de diferentes quadrantes da sociedade polaca, o que tem sido pano para mangas em termos de assuntos de discussão em todos os contextos. Uma escola de línguas é um terreno propício para o debate de ideias sobre este assunto, apresentação de argumentos e pontos de vista.
Duas das minhas melhores alunas defenderam a tese de que a lei é estúpida e que segrega os fumadores da população colocando-lhe o rótulo de marginais, bandidos e elementos prejudiciais à saúde social. O fumador é agora visto como um delinquente que se envenena e que quer rebocar os outros para a sua espiral de auto-destruição e rejeitam a conotação negativa que o seu prazer pessoal acarreta. Na ótica delas, fumar é um ato de socialização e não um crime de lesa-humanidade, algo que pode e deve ser feito obviamente sob as elementares regras de respeito pelo próximo mas nunca uma arma de arremesso para os fundamentalistas do vigor físico acusarem os prevaricadores.
Também salientam as vantagens que a “proibição” trouxe tornando os fumadores mais próximos, mais solidários, com um denominador comum que os acerca. O fumador é assim um ser mais sociável e que partilha a sua causa com outros iguais, conversam uns com os outros quando se encontram nas salas de fumo. Há uma causa comum entre os fumadores, uma reciprocidade de sentimentos que só quem fuma é que compreende e assim os fumadores ficaram um povo mais coeso e unido em torno da sua ideia. Os espaços exíguos, as gaiolas em que as áreas de fumo se tornaram expõe os animais fumadores aos olhos reprovadores dos que não fumam, dos “saudaveizinhos”, para a ostracização. As crianças apontam admiradas para os chimpanzés fumegantes que se acotovelam nas suas jaulas para darem umas passas, as mães abanam a cabeça reprovamentes e dizem que “aqueles senhores estão doentes”. Antigamente via-se o Cary Grant e o John Travolta cheios de petróleo no cabelo fumando atraíndo as fêmeas como sinal de virilidade, hoje em dia é o “não fumo!” que se tornou trendy. Mae West, Marlene Dietrich e Olivia Newton-John (sim, grandes influências do Grease) provocavam ereções masculinas com as suas baforadas, hoje diz-se que “beijar uma mulher que fuma é o mesmo que lamber um cinzeiro” (cá para mim, o Macário nunca lambeu nada de jeito…). Rematam com a inatacável teoria que fumar alimenta as relações interpessoais ao facilitar o contacto verbal, membros duma minoria votada pelos ostracistas a um purgatório constante até que venha o cancro redentor que os condene às penas eternas, castigo justo pelo consumo de tabaco e pela poluição insuportável a que sujeitaram o planeta.
Eu rio-me da histeria que todas as medidas despertam neste país. São as cruzes, os acidentes de avião, as leis anti-tabaco, as gripes gástricas de que só ouvi falar aqui, o resmungo constante sobre o frio como se a Polónia experimentasse ares polares pela primeira vez, o fim do mundo em cuecas quando alguém espirra. Prova disso foi a descontração ignorante com que acendi um cigarro no Wojska Polskiego antes do Legia – Arka sem que ninguém me repreendesse. Que cada um coma a sua massinha e o mundo será um lugar melhor para se viver, estão preocupados em enjaular os fumadores mas ninguém dá conta dos bêbados que dormem na rua nem da caca de cão que os porcos dos donos não apanham.
1 comentário:
Enquanto não fumador só posso estar satisfeito com esta lei anti-tabaco, lamento que isso possa ferir as susceptibilidades dos fumadores e seus parceiros de convívio mas o cheiro do cigarro comum é abominável para um não fumador. Cheira melhor uma ganza ou um cachimbo.
No entanto, na Polónia, há outros fundamentalismos como a crendice e a beatice, que cheiram pior, fazem muito mal à opinião pública e por incrível que parece cheiram a incenso.
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