terça-feira, 30 de março de 2010

Formiga Branca

Formiga Branca Na semana passada tive um amigo na minha casa que me veio visitar e passar alguns dias por cá na sua primeira visita à Polónia e a Varsóvia. Este meu bom amigo é um empresário de sucesso na área da hotelaria, um sucesso construído à custa de muito esforço, de apostas arriscadas em momentos fulcrais e fundamentalmente um sucesso baseado na arte de bem receber e tratar o cliente. Ele sabe como fidelizar as pessoas, tem olho para o negócio, uma sensibilidade extraordinária para criar espaços agradáveis e tem mantido a freguesia, o que já é muito bom em tempos de crise. Mal por mal, ainda é o único sítio que eu considero de classe na minha cidade. Contou-me ele que um cliente o abordou com o seguinte diálogo:

- Achas que um casal consegue orientar-se com €3000.00 por mês?

Resposta do meu amigo:

- Acho que sim. É claro que não vai dar para fazer férias no Brasil ou para comprar um T4 mas dá, até há famílias com crianças que se aguentam com menos dinheiro. Porque perguntas?

- Epa, a minha mulher está sempre a dizer para eu arranjar emprego…

Este diálogo é exemplificativo da mentalidade da maioria dos habitantes da minha cidade, uma terra que amo mas que não merece as pessoas que tem. Faro tem o grande problema da inveja, do ciúme, da maledicência, fala-se mal dos outros e das coisas porque sim. Fala-se mal do Farense, do Governo, do pai e da mãe, do clima, do patrão. Em Faro ninguém tem mérito pelas conquistas que obteve porque foram sempre facilitadas pelo fulano na repartição, pelo beltrano da Câmara Municipal ou pelo pai que é rico e que conhece o cicrano que é advogado. Em Faro a pequenez é apreciada, as pessoas querem-se modestas e de horizontes estreitos porque quem ousa mudar é maluco ou mete-se na droga. Em Faro os medíocres são louvados porque o simples facto de “ter” alguma coisa é sinal de exibicionismo e alvo fácil para todo o tipo de calúnias, ninguém vê o suor deitado e as noites sem dormir, ninguém contabiliza as horas queimadas a estudar, nada. Só se vê é que “se ele tem aquele carro é porque anda a vender droga” ou “agora comprou uma vivenda nas Gambelas, de certeza que deu a palmada em alguém”. É uma coisa cultural, enraizada nos costumes dos farenses e é tão normal como no Porto se comer uma francesinha

Faro Conheço este meu amigo há uma dúzia de anos e fiquei contente por ele ter-se lembrado de mim e ter-me vindo visitar aproveitando uma ocasião de trabalho em Varsóvia, vi que ele ficou satisfeito pela forma como que me tenho adaptado à Cidade Capital e ao seu frenético ritmo de vida. Fiquei muito sensibilizado com os elogios que me prestou, significou muito para mim pois eu vejo-o como o exemplo precoce (só tem 28 anos) de empreendorismo que devia ser regra em Faro e receber tais cumprimentos foi uma honra. Falámos da importância que existe em sair de casa e ver o mundo, saber o que se faz lá fora, aprender, crescer, coisas que não conseguimos fazer se passarmos toda a vida debaixo do nosso alpendre. Faro parece um pouco o The Truman Show, as pessoas não saem porque têm medo ou porque estão demasiado acomodadas às suas vidas pequenas, muitas insignificantes, agarradas à tal mesquinhez que, em Faro, compensa e recompensa. Acabámos a visita a beberricar vodca com mel, ele levou uma garrafinha para casa e a questionarmo-nos porque é que a nossa cidade, a nossa linda cidade que tanto amamos, tem pessoas assim.

Eu não acredito que são as pessoas que fazem as cidades porque senão eu não gostaria de Varsóvia como gosto nem teria a constante satisfação de voltar a Faro, gosto muito mais dos lugares do que das gentes. Talvez por isso ficámos os dois, farenses de alma e coração, a olhar para a tristeza que são (a maioria d)as gentes de Faro, pequenas em ambição e picuinhas nos julgamentos que só dão pena por sabermos que irão rebentar, mais dia ou menos dia de tanta dor de cotovelo. Mas tal como os polacos, que são os primeiros a falar mal dos defeitos do seu país, os farenses também não admitem que alguém de fora lhe aponte os podres. Eu estou fora mas não sou de fora, e como vivi mais de 30 anos nessa realidade tenho legitimidade para afirmar: Que bom estar a 3000 e tal km dessa formiga branca!

7 comentários:

Unknown disse...

Manecas Nuno "Sovi" Sim manecas!!!Neste momento para mim deixaste de ser Nuno... Estou no direito de dizer e sinto me no dever de deixar o meu comentario ou seja a minha experiência nessa Capital da Polónia tão cinzenta, carregada de batalhas e guerras, cheia de cenários pesados e ao mesmo tempo com um espirito Enorme para se Divertir,sorrir e dar gargalhadas, aberto ao convivio e socialização, trabalhadores e mecanizados até demais mas é hora de dizer eles sabem como Viver!!!
Agora,.. Não me digam a mim que devo prescindir de me instruir pessoalmente neste momento que é a vida, pois esta passagem que devemos agradecer de ter tido a nossa oportunidade de conseguir respirar não aos Deuses mas, Sim a nós próprios porque pessoalmente é muito de longe que eu prefiro abdicar de colocar plasmas e outros fétiches mensalmente nas areas da minha casa como na vida,tentando sobreviver na corda bamba ser saber o que "Ela" é realmente e deixar de sentir os verdadeiros momentos de prazer completos e longe dos obstáculos criados por engenheiros de "marketing" que nos intusiasmão e "obrigam-nos" ao consumismo do acumudismo!!!Enfim,
Sinto que todo o povo Português não só o de Faro, tem falta ou até mesmo algum receio de se libertar, conviver sem "coscuvelhices" e dar valor aos pequenos grandes valores dos nossos Homens de outra data que partiam aos descobrimentos de outras terras e horizontes com toda a coragem e determinação criando o nosso unico orgulho de hoje em dia!!!
Por isso eu agradeço do fundo do coração esta opurtunidade como toda a tua hospitalidade e disponibilidade de poder ver Não mais um Mundo mas sim outro mundo que não tem mais beleza nem mais capacidades que a nossa "terrinha" que nos proporciona a pura e sortuda localização na maior parte do tempo com o nosso maravilhoso Sol a sorrir e coberto de paisagens lindas, rodeadas de um quadro azul que é o mar com toda a sua magia e frescura!!!
Podia acrescentar uma serie de outras visões mas cada um leva a vida como sabe e quer mas não, como pode...
Mesmo estando longe sentimos sempre o perto é o coração que fala mais alto...
Para terminar ainda quero ser teu vizinho um Dia =)
Melhor que isto?!!
Só duas vezes isto... ahahahah

Aquele abraço "ZDROWIE"
Miguel

Gabi disse...

Acredito que isso não é problema da sua cidade...mas de toda cidade que é pequena...onde sobra tempo pra se falar da vida alheia! Sou brasileira, moro em São Paulo, mas meus pais moram em uma cidade pequena, e costumamos brincar que lá, não existe nem regime, nem comida...se uma menina engordou é porque engravidou, se emagreceu é porque tem AIDS!
Tem gente que aproveita o tempo que sobra pra se divertir, ver coisas bonitas, descansar, crescer, etc...mas tem muita gente que "aproveita" esse tempo para ver a vida (a sua e a alheia) passar...

PM Misha disse...

manolas,
mi casa es tu casa, hoje e sempre. olha que deixaste saudades... q;)

gabi,
então percebes bem o que quero dizer, só não sei é se o problema vem de que a cidade é pequena ou de que as pessoas são pequenas.

Ryan disse...

Nuno este post descreve um mal nacional. Este é um problema que nós portugueses temos. Não falo da geração antes da nossa apenas mas o mal é geral. Se temos é porque conseguimos desta e daquela maneira se não temos sou culpados por não ter. Na Polónia apercebo-me do mesmo. A pouco auto estima de milhões de Polacos leva-os a terem a mesma atitude que os Portugueses.

joao conde disse...

Olá Nuno, tudo bem? Antes de mais queria dizer que sigo o teu blog já há mais de meio ano e é das coisas mais interessantes e divertidas que se encontram pela blogosfera. Já há bastante tempo que andava para postar qualquer coisa, mas foi passando e hoje queria dizer qualquer 'coisita' sobre a formiga branca, ou sobre o grosso da sociedade portuguesa.

Estou de volta à tuga depois de ter estado a viver um ano em londres. Não é por ter emigrado que abri os olhos, porque sempre tive uma cultura critica em relação ás coisas, mas conhecer realidades diferentes faz-nos crescer. Quanto ao assunto em si, Portugal tem potencialidade quase para 'ser o que quiser', mas isso nunca irá acontecer com esta mentalidade. Destaco fundamentalmente uma das razões que apontas, a inveja. Enquanto que em certos países europeus o facto de vermos o nosso vizinho bem sucedido faz-nos ter vontade de fazer coisas, ambicionar coisas melhores, fazer mudanças; em Portugal a postura é de desdenhar. Acho que quando encaixas no perfil da sociedade portuguesa consegues viver de uma forma bastante agradável, mas quando não te revês na forma de estar, na forma de pensar, etc. é uma tortura. Enfim, nem tudo é assim e isso permite a entrada de algum oxigénio.

Ah, esqueci-me de me dizer como é que vim aqui parar. A minha namorada é polaca (same old, same old story) e conhecemo-nos em 2006. Já vive em Lisboa desde 2007 e entretanto já fala fluente Português. Conheço minimamente a Polónia e familiarizo-me bastante com as coisas que escreves. A língua do diabo é que é dificil de aprender, mesmo com esta professora fantástica :)

Bom, não me vou alongar mais. Espero começar a postar com maior regularidade. Um abraço.

João Conde

PM Misha disse...

ryan,
engraçado como portugueses e polacos conseguem ser tão parecidos nesse particular. quando é para elogiar, nada mas quando é para botar abaixo estamos na linha da frente.

joão conde,
justamente. já não consigo "encaixar", já me faz demasiada comichão. obrigado pelas palavras agradáveis e por ires passando por cá q:)

abraço

Anónimo disse...

Faro é apenas o reflexo do país...em que se pensa que o "estatuto social" é dado pelo relógio, carro ou roupa que se ostenta e principalmente pelos "conhecimentos" que se conseguem e não pelo mérito ou valorização pessoal. Portugal não merece os portugueses, de tão tacanhos, fechados e acomodados que são. Mas uma coisa é certa e falo por experiência própria, só viajando e conhecendo outras realidades nos apercebemos no que vivemos. Estudei até tarde, comecei a trabalhar tarde, comecei a viajar tarde. Infelizmente. Apesar de pouco conhecer, 4 ou 5 viagens foram suficientes para mudar completamente a minha mentalidade. Apercebi-me que sim, também há qualidade de vida noutros sítios (surpresa!), os algarvios não são os únicos privilegiados nesse campo. Exemplos como o teu, do suíço e outras pessoas próximas, que emigraram para locais e sobretudo climas totalmente opostos ao nosso são prova disso. Nascer algarvio já não é per si argumento para nos acomodarmos.

PS - Já cheira a peitada..

Ruben