terça-feira, 22 de novembro de 2011

Os novos filósofos facebookianos – um artigo que tem muito pouco a ver com a Polónia


A crise que grassa pela Europa em geral e por Portugal em particular tem criado diversos problemas a muitos portugueses, portugueses que perderam o emprego, portugueses que perderam poder de compra, portugueses que perderam a esperança num futuro melhor pelo menos a curto-médio prazo. As únicas coisas que vão crescer em Portugal são as prestações dos créditos, os impostos e contribuições, a precariedade e incerteza no trabalho, o medo da vergonha grega. O panorama não é bonito porque esta conjuntura desfavorável abateu-se sobre um povo por natureza melancólico e fatalista, uma gente que apesar do rótulo de alegre e otimista não aposta um cêntimo no dia de amanhã. É como se tivessem mudado uma pessoa com tendências suicidas para um 15º andar, convidaram-no à depressão e miséria psicológica.

Vê-se esse miserável estado de espírito nas notícias, nas declarações públicas que anunciam mais cortes nas depauperadas regalias do Zé Pagante, na tristeza patente no rosto dos portugueses e nas suas comunicações ao mundo através das redes sociais, um dos poucos espaços onde ainda se pode ser verdadeiramente democrático e mandar à merda quem tem toda a obrigação de ir. Alguns portugueses fazem das redes sociais megafone da sua insatisfação, do seu estado de alma, choram o seu fado, solidarizam-se com o próximo, estendem lenços e oferecem ombros para o parceiro chorar. Multiplicam-se os apelos à insurreição, à contestação, à desobediência, até se discute se é a própria democracia que está ameaçada. O Povo parece unido mas também parece vencido, vencido pela luta desigual contra as tríades e contra os mercados, contra a inevitabilidade de sermos fodidos e sofridos. Assim andam os portugueses, assim andam alguns que eu conheço e devido a esse estado de coisas alguns deles dedicam-se agora a pensar e a refletir no que os rodeia, na atualidade e no ambiente.

Há uma mania recente de publicar nas redes sociais, no facebook concretamente, frases que supostamente têm alcance quase esotérico, pensamentos duma profundidade mística que teoricamente transmitem bem-estar e boas vibrações a quem as lê, vibrações essas que serão repassadas por todos quantos repitam o gesto. As palavras são bonitas, agradáveis e bem intencionadas mas as frases que formam são ocas, desprovidas de qualquer conteúdo aproveitável e têm tanto de importante e válido como a previsão do horóscopo de uma revista de donas de casa. Juntam um punhado de sílabas que consistem em ideias insípidas e inodoras, lugares-comuns que enervam de banalidade, clichês usados e abusados, uma pobreza intelectual que só consigo justificar devido à grave crise de confiança que mina alguns portugueses e que lhes tolhe o raciocínio. A auto-ajuda está aí para quem quiser sentir-se coitadinho e há uma frase feita para cada caso prontinha a sair do forno das vulgaridades, pleonasmos a granel para combater a tinha da crise e a lepra da tristeza, aqueles a quem a má-sorte lazarou têm nos novos filósofos pré-fabricados do feicebúque a panaceia para a escuridão dos seus dias, lê-se o lema do dia e a nossa vida fica como nova, por estrear, somos capazes de dar um pontapé numa estrela...

Eu daria crédito aos pensadores cibernéticos contemporâneos se houvesse nos seus escritos algum sumo, se encontrasse nos seus postulados algum motivo sério de reflexão, algum princípio, alguma conclusão concreta que se pudesse tirar. Mas não, a única coisa que eu vejo é uma estupidificação em massa de pessoas que eu muito prezo – porque são o mesmo que eu – mas que aparentemente abdicaram de pensar, de criticar, de apontar o dedo e vivem num ciclo de compaixão mútua, do “tenham-pena-de-mim”, do amiguinho que dá palmadinhas nas costas. Não me parece que seja assim que se deva encarar a vida mas como (ainda) vivemos em democracia também reconheço que não sou ninguém para negar o direito que as pessoas têm à patetice.

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