quarta-feira, 7 de julho de 2010

III – Do amor

Ah, o fogo que arde sem se ver…

Ia escrever no texto anterior algumas linhas sobre amor à camisola mas deixei isso para aqueles que ainda acreditam no Coelhinho da Páscoa. Hoje em dia há amor ao cifrão, amor à camisola é o caso de Abdón Porte, um defesa uruguaio do Nacional de Montevideo que preferiu suicidar-se aos 37 anos em pleno grande círculo do seu estádio do que passar pela desonra de perder a titularidade do seu amado clube. É difícil catalogar um amor, se é um amor profundo, verdadeiro ou um amor superficial e passageiro. Eu próprio não tenho muito à-vontade (nem moral) para dissertar sobre o tema mas posso tentar destrinçar o novelo à luz da entrada anterior que é a deixa para esta, vou tentar explicar o que é o amor, segundo a minha doutrina, usando três exemplos.

O amor à família – Como a minha tia e a minha mãe que são as pessoas mais importantes no meu sangue, agora que o meu tio já não está entre nós. O amor que sinto por essas pessoas tão especiais é o amor próprio de alguém que está contente com o resultado que essas pessoas tiveram no meu processo de educação como ser humano, no seu jeito às vezes atabalhoado de mulheres algarvias. Foram mulheres que tentaram no melhor das suas capacidades fazer de mim uma pessoa boa, de bons valores e de moral. Não me considero um patife e creio que essa opinião é consensual entre as pessoas que comigo convivem passe alguma imodéstia. Ou seja, o produto das suas ações de educação é positivo, fizeram de mim um homem que tem algum capital de simpatia entre os seus pares, um tipo fixe e honesto que não mistura o cinzento com o branco e preto. Prezo a verticalidade da minha espinha, a minha coerência e se há alguém a quem o devo será a esse par de mulheres. A minha paga? Amá-las. Não posso dar mais mas sei que elas não querem mais que isso.

O amor ao parceiro – Ou à parceira, no meu caso porque eu não gramo nada paneleiragem. Chamem-me preconceituoso ou homofóbico porque eu também tenho de ter defeitos mas tenho amigos negros, ciganos, brasileiros, talvez judeus, certamente entre imigrantes do Leste e dou-me bem com toda a gente, joguei 20 anos futebol com eles, abracei colegas em tempos de vitórias e chorei com eles as nossas derrotas. Porém rabetas é coisa que sempre me repugnou e quero distância de apreciadores de enguias cruas porquanto sou hetero e o amor do meu parceiro equivale a dizer “o amor da minha namorada”. Descobri que esse amor não é o que alguns dizem, que cega as pessoas, que nos arrebata e nos deixa vulneráveis aos encanto dos outros. Nada disso. Esse tipo de amor é tranquilo e discreto, vai conquistando palmo a palmo como a maré que enche e inunda o sapal até se instalar definitivamente, ramificado, consolidado. Esse amor é incolor e inodoro, sabemos que está presente mas não o conseguimos verbalizar porque é um bem-estar absoluto e as coisas absolutas são difíceis de explicar. Não precisamos de o mencionar constantemente, de o comprovar, de o mostrar. Ele é, simplesmente, o amor. Está no sítio dele que ele tem só para si, mais nada o ocupa e nada o ameaça. É tão imenso que se ri dos que lhe querem fazer mal, dos que pensam que o podem atingir, é tão grande quanto a mais alta montanha mas pesa tanto quanto o mais singelo floco de neve. Este é o amor que tenho pela minha namorada, um amor diferente mas igualmente sério e importante. Não é maior nem menor, apenas diferente, talvez complementar.

O amor ao clube – Aqui todas as teorias caem por terra pois este é um amor totalmente irracional e que não obecede a nenhum padrão. O amor que eu tenho pelo meu Sporting deve ser igual ao que muitos têm pelo FC Porto ou por outro clube qualquer, foge às definições académicas e tem regras próprias. É um amor que extasia e empolga os sentidos porque catalisa emoções, tem pouco de razão e não procura explicações no campo da teoria. É um amor constante, militante e necessariamente praticante que é feito de gritos e cigarros, de socos no sofá e peles roídas, de esperanças e frustrações. É vulcânico nos momentos de raiva e refrescante nos triunfos, tanto eleva os protagonistas ao Olimpo num segundo como os lança nos dentes de Cérbero. O amor que tenho pelo Sporting é comum e transversal ao das crianças que jogavam comigo à bola na Escola do Carmo nos anos 80 e que sofreram com a seca de 18 anos mantendo-se fiéis e estóicos na sua convicção que um dia iríamos vencer, esse amor que rebentou naquele 14 de Maio de 2000 quando André Cruz, Ayew e Duscher deram corpo a um sonho, quando tudo fez sentido, quando amigões como o Toni, o Artur, o Giga, o Cartaxo e o Lino entre outros abraçaram-se comungando lágrimas e gargalhadas, o amor a uma facção, a uma cor, a um princípio. Este amor, embora não requeira correspondência, nunca será traído porque recrudesce nos momentos difíceis. Este amor não conhece condições nem tem alíneas, é um contrato unilateral que consiste em duas palavras: “até morrer”. Este amor nada me dá mas eu tudo lhe dou e mais daria se mais tivesse, é um amor a fundo perdido, infinito e perpétuo. Tenho sempre enorme dificuldade em traduzir o frémito que sinto quando vejo o Leão Verde, como quando voei com a Ewa perto de Alvalade há 3 semanas ou quando se aproxima um jogo, é irracional, primário, animalesco. Talvez se consiga resumir com “é o Sporting!”, e o Sporting é o nosso grande amor.

Em Agosto vou a Alvalade com a minha namorada e vou para lhe apresentar o Sporting, para lhe apresentar o meu grande amor, para que ela me consiga compreender, para que consiga perceber a minha natureza e conhecer o fenómeno, para presenciar Alvalade ao rubro. Se ela não conseguir, se ela não se emocionar nem se sensibilizar… Não faz mal, para o amor há sempre lugar.

5 comentários:

Anónimo disse...

Grande Sov,está fenomenal este post...gramei bué...leva a Ewa sim a Alvalade quem sabe não será uma futura sócia do SCP....;)
Abraço e porta-te bem

Luis Kuelho

PM Misha disse...

Tem de ser, se não a levar for ela nunca poderá saber completamente quem eu sou. em agosto vou batizá-la q:)

Ricardo disse...

Depois do que escreveste ela nunca mais te larga. :)

Anónimo disse...

Tinha muito para escrever ... mas acho que isto resumo tudo o que teria de escrever ...
http://www.youtube.com/watch?v=32bXfZS6Eoc&feature=player_embedded

http://www.youtube.com/watch?v=OUiMAYxECGk

Merx

PM Misha disse...

eu sei, mano. até porque ainda temos um banho na doca em dívida.
entretanto, toma lá aí um aperitivo do nosso próximo melinho:

http://www.youtube.com/watch?v=v_V6fxrJHh4