A noite cai e a temperatura não parece baixar, o ar continua húmido, pegajoso, lembra os entardeceres da República Dominicana aos quais só lhes falta o mar e as palmeiras. O resto existe, o calor e a sensação de que precisamos de outro banho cinco minutos depois de termos saído de debaixo do duche. Há um contraste incrível, uma diferença enorme entre a Polónia de inverno e a Polónia de verão. Do frio ártico que varre o país, das massas de ar polar que assolam a Europa Central e que nos fazem tiritar na rua, castigando-nos com violentos –20º ou –25º até ao calor abafado que obriga as pessoas a estufar debaixo de 30º ou até 35º, uma diferença de temperatura na casa dos 60 graus, coisa absurda. Os roupeiros têm de ser maiores para albergarem tanta roupa de inverno, de verão e de meia-estação que faz falta, casacos, sobretudos e blusões dividem a camarata com as t-shirts, camisolas e camisas mais frescas. O curioso é que, ao contrário do que se passa(va) na casa dos meus pais em Faro, não se pode tirar a roupa de inverno de lugar para colocar a de verão quando a estação muda porque não se sabe quando uma gabardina vai ser necessária em pleno julho ou um casaco mais forte vai fazer falta nos fins de tarde mais frescos de agosto. Temos de reservar um espaço imenso em casa para guardar toda a roupa, todos os sapatos e botas, todos os calções e gorros muitas vezes na mesma gaveta, uma tarefa interessante se tivermos em consideração a pequenez da maioria dos apartamentos de Varsóvia, pelos menos aqueles que pertencem aos meus amigos que por não nadarem em dinheiro têm de viver em áreas mais módicas.
Estas condições climatéricas são ideais para grandes trovoadas de verão, tempestades terríveis que assolam toda a Polónia sem deixarem nenhuma pedra por levantar. Há pessoas que não se importam com trovoadas, há mesmo que se ponha à janela para assistir ao espetáculo mas eu não sou desses, não gosto de trovoadas como já referi em artigos anteriores. Os entendidos dizem que as fobias tratam-se com a exposição contínua à fonte do medo, não que eu tenha medo de trovoadas – prefiro chamar-lhe respeito. Acho que algo semelhante me está a acontecer visto que quando a tempestade de aproxima e quando a banda de trovões anuncia a sua chegada não me enervo tanto como antigamente. Quatro anos a conviver com estas situações já me dão algum calo e não me irrito tão facilmente. Mas há um problema que permanece e para o qual eu não hei-de ter remédio, é o horário que as malditas escolhem para aparecer, raramente durante o período de tempo que passo no trabalho, concentrado demais para ouvir e ver o que quer que seja, mas sempre alguns minutos depois da meia-noite, hora em que habitualmente toca a recolher na minha casa. Às vezes até chegam mais tarde, deixam que eu adormeça embalado pela brisa que sopra entre os ramos dos teixos que tenho em frente à varanda, a corrente fresquinha que passa de janela em janela e ajuda a cair no sono, mas depois entram ventanias vigorosas e repentinas que batem portas e vidros, explosões ensurdecedoras, clarões arrepiantes e olhinhos bem abertos porque não há quem consiga dormir com tanto barulho, tenho de me levantar para fechar as janelas porque batem nos caixilhos com tanta força que podem quebrar-se a qualquer momento. Acho que a Natureza faz de propósito, uma sinfonia de trovões, uma revolução que eclode quando a cidade está mais pacífica, mais tranquila, mais silenciosa. Parece que é para lembrar do sítio onde estamos, Varsóvia, onde nada surge fácil, tudo é obtido a duras penas, nada é ganho sem suarmos as estopinhas. Segunda-feira é por hábito o dia mais complicado da semana, pois eis uma trovoada épica durante a madrugada para começarmos bem a jornada, de bom espírito e motivados para o trabalho.
Nem quando os dias parecem bonitos Varsóvia nos faz a vida fácil.
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