domingo, 18 de dezembro de 2011

Honestidade acima de tudo

Rapina Ia a caminho de uma reunião de trabalho, passo apressado na gincana entre os vários buracos abertos pelas inúmeras obras que transformam Varsóvia atualmente num autêntico estaleiro, quando um sujeito alto de barba por fazer e com um casaco muito grosso me aborda e pergunta:

- Perdão, meu senhor. Tenho uma pergunta muito educada para si. Eu estou com grandes problemas pessoais, a minha mulher deixou-me e estou numa situação muito delicada. Preciso de quatro złotych  para comprar uma cerveja no supermercado para ver se aguento este dia. Peço desculpa se o incomodo mas preciso realmente de beber uma cerveja para suportar a minha vida.

Este pedido assaz invulgar surpreendeu-me e deixou-me a olhar para ele durante uns bons segundos sem saber o que dizer, fiquei ali de frente para aquele homenzarrão vestido como um esquimó, atarracado em casacos e pulôvers sujos e sebentos, com os argumentos dele a entoarem na minha cabeça, a fazerem-me confusão e eu sem saber porquê. Ao fim de uns segundos de reflexão compreendi o que me fazia tanta impressão. Era a clareza dele, a sinceridade que ele empregava nas palavras como se não tivesse nada a esconder, jogo limpo e cartas na mesa. Era mesmo aquilo que ele queria dizer, não eram uns centavos que lhe faltavam para o bilhete do comboio ou para um pão com manteiga que serviria de primeira refeição do dia. Nada disso! Dinheiro para cerveja tão somente era a aspiração do homem e ela comunicou-a sem rodeios nem patranhas.

Por regra não dou dinheiro a pessoas que não me dêem nada em troca, que toquem uma peça no violino ou na guitarra, que mostrem alguma habilidade ou talento de malabarista ou tocador de xilofone e eu dou o donativo de bom grado. Uma vez encontrei um fulano em Cracóvia que me pediu uma moeda em cinco idiomas diferentes – polaco, inglês, francês, italiano e alemão. Eu até pensei que se ele me pedisse em português eu recompensava-o com uma nota! Por isso demorei uns segundos de hesitação a reagir a esta solicitação até que a clarividência me atingiu e pensei com os meus botões:

- Então se eu ando a pagar o obsceno salário daquela matilha de salafrários a que chamo “classe política”, uma quadrilha de vigaristas, escroques, mentirosos e gatunos do pior calibre que nos roubam e prejudicam com a maior impunidade, porque raios não hei-de dar uma moeda a este tipo? Ok, é para cerveja, não é para os melhores fins mas ao menos foi honesto, não prometeu nada que não pudesse cumprir, não me enganou.

Tive pena de só ter moedas pequenas na carteira mas dei-lhe tantas quantas tinha, não lamento nenhum tostão. Foi dinheiro bem melhor empregue do que o ordenado que esta cambada de chulos e agiotas anda a sugar os contribuintes portugueses.

2 comentários:

zekarlos disse...

Ontem tive uma abordagem semelhante em Varsovia! Por um "mendigo" que falava ingles e tudo, imaginem? eheh
Um abraco e ate a proxima

Tinq disse...

Essa sinceridade é deveras tocante!
Em Lisboa é raro ver essa crueza na abordagem.Bem mereceu os trocos,
E pensar por vezes que essa pessoas, já foram cidadãos trabalhadores, donos de uma vida normal, e dignidade... Dá que pensar!