Respira-se um ambiente diferente em Varsóvia desde o passado fim de semana. As obras da segunda linha do metropolitano chegaram a uma das principais ruas da cidade, por casualidade aquela onde passo maior parte do tempo de trabalho, e fecharam-na ao trânsito devido ao levantamento de asfalto, de calçada e aos trabalhos de perfuração que se vão iniciar em breve. Isso causa problemas de grande monta a quem tem de usar as ruas como via de transporte de e para o trabalho, seja de autocarro ou de automóvel, porque as alternativas não são muitas e estão sempre congestionadas. Esse vosso escriba não padece desse mal pois ele vive e trabalha a 5 minutos de estações de metro além de ter uma capacidade de lidar com problemas potencialmente frustrantes muito diferente dos polacos tendo assim a vida facilitada no que concerne a esse tipo de stresses.
Por causa do trânsito e do stress o meu primeiro encontro do dia agendado para as 8:00 vai começar às oito e meia, a mensagem com o alarme de atraso apareceu já eu estava quase à boca do prédio mas não levei a mal, é da maneira que me posso sentar e deitar um olhar tranquilo para a cidade como tanto gosto de fazer, observando as moles de gente que regurgitam dos transportes públicos, passos apressados em direção aos escritórios, aos gabinetes, às repartições e secretárias. As portas giratórias depositam funcionários em ritmo alucinante e não se consegue estabelecer um padrão, temos rapazes de auscultadores coloridos e sapatos elegantes que entram no edifício a consultar blackberries, homens rudes de pólo azul claro e calças padrão-exército numa demonstração de total ignorância sobre as mais básicas regras de critério ao vestir, outros de calças aos quadrados e ténis Adidas verdes musgo, outro atentado à iris humana, e senhores mais sóbrios de trajo clássico, o fato bem assente nos ombros e gravata adequada ao padrão. Parece que quanto mais velhos são os polacos melhor se vestem, ou o problema é que os polacos mais jovens desaprenderam a vestir-se?
Entretanto recebo outra mensagem, faltam cinco minutos para a hora combinada e sinto o pânico no outro lado da linha porque o trânsito está pavoroso. Eu, pelo contrário, estou confortável no sofá do hall do edifício de escritórios onde o ar condicionado me protege do bafo quente da rua e digo-lhe que não se afobe. Mas cedo aborreço-me da paisagem, vou para o exterior do prédio e desço aos parcialmente renovados túneis da Estação Central para me divertir a ver o enxame de pessoas que por lá caminha, dá-me um gozo muito grande assistir à pressa das pessoas enquanto exibo a minha obscena tranquilidade, muitos olham para mim quase que ofendidos, insultados por alguém se sentir tão descansado numa manhã de terça-feira onde toda a gente anda à cabeçada. Porém eu sigo na minha, um homem raro de óculos escuros e gel no cabelo, estático como um cartaz publicitário, corpo estranho no meio do granel, serenidade que contrasta com a tensão que se sente no ar daqueles túneis dos quais não se podem colher imagens sob risco de levar uns tabefes de um dos seguranças barrigudos que vigiam as galerias e continuo a olhar para dentro das lojas, a ver a taxa de câmbio do zloty, as manchetes dos jornais, as filas para o café, o leva-e-traz dos elétricos e comboios suburbanos que continuam a entornar pessoas tonteadas pelo ritmo imposto pelo de comer e de vestir, ainda por cima com metade das ruas do Centro cortadas ao trânsito.
Faz-se quase nove horas e eu volto para o hall do prédio, a hora está reservada e só acaba quando chegar ao fim, por isso sento-me de novo e puxo do notebook para registar estes instantes matinais. Assim que começo a escrever estas linhas entra uma incrível morena de olhos claros encaixada num estreito fato preto, saia curta a tapar a porção superior das suas pernas desprovidas de meias e imediatamente a minha vista se volta para ela, ajusto o zoom e regalo-me com a imagem, com a graciosidade das linhas, um tratado de ergonomia, um primor! Ela vem e senta-se ao meu lado, delicada e feminina, ajusta a saia às simétricas e delgadas nádegas quando se baixa para o sofá, eu absorvo-lhe o breu dos cabelos, com a ideia tiro-lhe a pouca roupa que ela traz e mergulho na água de colónia que ela terá estrategicamente vaporizado na sua nuca. Tiro o telemóvel e escrevo ao meu parceiro de reunião para não ter pressa, está um trânsito terrível e não vale a pena perder a cabeça com coisas que não podemos resolver, não é verdade?
1 comentário:
Caro Nuno, enviei um email para o endereço electrónico que apresenta no seu perfil do blogue, não sei se recebeu?
Um abraço
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