quinta-feira, 29 de abril de 2010

À Pressa

herança Foi publicado um estudo num jornal polaco que revela que as pessoas que andam mais depressa na Polónia são os residentes em Varsóvia. Compararam o ritmo da passada de vários habitantes de diferentes cidades da Polónia e a conclusão é de que os varsovianos são os mais apressados, nada de espantar numa cidade que vive vertiginosamente e sem tempo para nada.

Já aqui mencionei a voragem que consome os varsovianos e o espanto que tal me causa, principalmente porque venho duma terra onde se ouve o barulho das taganas a saltar na água da Doca e onde há tempo para ir aos sítios a pé. Em Varsóvia as pessoas carregam no botão que fecha as portas dos elevadores para pouparem 3 segundos, os varsovianos disputam centímetros enquanto esperam que o semáforo dos peões mude para verde, esfregam ombros para ganhar melhor posição na entrada para o metropolitano, completam as frases daqueles que hesitam na palavra. A cidade nova engole a cidade antiga, empurra os prédios velhos, chuta o passado para longe, às vezes até atropela a herança para dar lugar ao conforto e ao consumo. O segundo está mais caro que o petróleo e não se pode desperdiçar tempo, uma corrida constante contra um adversário que chega sempre primeiro. Uma corrida escusada entre coelhos brancos, escusada, digo eu, porque não se consegue ganhar à vida, uma conclusão já foi tirada por Woody Allen há muito tempo.

Quando dás por ti estás velho, tens netos ou não, olhas para trás e vês que levaste uma vida quixotesca e que os moinhos de vento são cada vez maiores. Tiveste o teu fiel escudeiro ou não, encontraste (ou não) a Dulcineia que procuravas, um a um foste furando os dias desse painel que é o calendário que cada um tem. Terá valido a pena, terás fechado o círculo, terás orgulho no que fizeste?

Eu não quero chegar ao ponto de ter de tirar essa conclusão à pressa, de chegar ao momento e ter de exclamar “Já?!”, de pedir mais minutosCafé apressado para dizer ou fazer mais alguma coisa que devesse ter dito ou feito. Não, não quero engolir o café à pressa e queimar a língua porque queria atravessar a rua enquanto estava verde quando posso esperar e ir beberricando o meu capuccino matinal tranquilamente a caminho do trabalho. Eu quero tocar a vida para a frente no ritmo que a Natureza me deu e não quero acelerar o pitch para velocidades que não consiga suportar, o meu tio viveu assim, durou quase 90 anos e morreu na sua casa a dar vereditos. Quando o Criador inventou o tempo, inventou bastante.

Varsóvia é engraçada, até as casas comerciais têm nomes que instigam literalmente, à pressa.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Na Polónia sê Polaco - 9

Kefir Uma parte importante da cultura dum país são os seus hábitos alimentares e a sua gastronomia. No meu trabalho enfatizo esta componente para acentuar as diferenças entre os usos dos polacos e dos portugueses, povos muito diferentes no comer quer seja nos horários de refeições, quer seja naquilo que comem. Outros emigrantes portugueses têm dedicados linhas às coisas estranhas que os polacos comem do tipo pepinos em conserva – uma coisa abominável, pasta de rábano a que dão o nome de chrzań e sabe tão mal como chupar uma pilha descarregada ou a bela da couve fermentada que eu sempre designo de “couve quase podre”. Em abono da verdade, na Polónia também se podem encontrar delícias como as sopas polacas, consistentes e nutritivas além de saborosas, e todas as carnes frias e quentes que se possam imaginar. Os polacos cozinham bem a carne, especialmente grelhada e a qualidade deste alimento é reconhecida ao ponto da Polónia ser um importante exportador. Coisa que não me entra na cabeça, porém, é o remédio nacional contra a ressaca – o Kefir.

Este produto é um laticínio e é como se fosse uma espécie de iogurte com a diferença de ser produzido com outro tipo de bactérias. Tem umBactéria de Kefir sabor que se situa entre o iogurte natural e o leite que ficou aberto fora do frigorífico por 3 dias, azedo e desagradável,  e é usado principalmente no tempero de saladas. O kefir tem também um papel fundamental na cultura deste país como o remédio santo contra a ressaca pois raro é o polaco que não engole meio quilo de kefir no rescaldo duma inundação de wódka. Há também quem prefira kefir ao pequeno-almoço para limpar as impurezas do estômago, utilizando este produto como um detergente gástrico.

Maślanka fresca Eu sou um perito na matéria de laticínios, sou fanático por tudo o que diga respeito a leite e bebo mais de um litro de leite fresco por dia sem especial esforço, mas este kefir custa-me a entrar na ideia e não vejo utilidade prática para o produto. Sabe mal como o raio (a Karolina comprou um mas não tinha vontade de comê-lo e deu-mo para mal dos meus pecados), não substitui cabalmente a maionese na salada e continuo a preferir a minha fórmula de “uma litrada de leite antes de um intenso round de junk-food” para curar o ressacão. As singularidades dos laticínios polacos não se ficam pelo kefir pois também a maślanka tem protagonismo. O equivalente ao português leitelho - o líquido que sobra depois da nata batida ser transformada em manteiga ao qual são adicionados aromas de morango e baunilha e que são consumidos como um iogurte aguado.

Maślanka Nunca vi kefir nem maślanka em Portugal e não sei se esta invenção do Cáucaso já chegou ao Atlântico. Não sei se outros patrícios experimentaram esta coisa estranha e quais a suas opiniões. Eu passei quase os três anos que tenho vivido na Polónia sem recorrer a tais especialidades para me azedar os dias, acho que posso muito bem passar mais uns quantos. E não me lixem! Depois de passar a manhã a limpar a tubagem com um litrinho de leite do dia, um Double Whopper do Burger King é do melhorzinho  que há para curar uma ressaca, tem algum jeito tratá-la com leite azedo?! Isso é o mesmo que tentar apagar um fogo com petróleo…

terça-feira, 20 de abril de 2010

O que é que a gente tá aqui fazendo? - 7

Wawa Dá gosto passear por Varsóvia agora que o tempo está melhor, o meu trabalho permite-me ter estes pequenos luxos e investir tempo no ócio, observar as pessoas e a cidade. Gosto disso, dá-me um prazer enorme olhar para as formigas trabalhadoras com o ar de supremo gozo próprio de quem é dono do seu próprio tempo e pode administrar os minutos do dia a seu bel-prazer, a cigarra que desfruta do sol enquanto o exército de operários marcha de laptop a tiracolo, passo certo e combinado no ritmo e nas cores sóbrias dos casacos, soldados de cabelo curto e claro que olham para mim com zanga – dizia inveja por não poderem fazer o mesmo que eu. Eu posso respirar o ar da rua sempre que quiser, eles não. Temos pena.

Uma rapariga alta corre para apanhar o autocarro e eu ajudo-a com o olhar, ela corre algo desastradamente procurando equilibrar-se nos saltos altos e desiste quando vê que não consegue ganhar a guerra contra os sapatos e a saia curta. Passo por ela e rio-me da sua falta de jeito, ela recordou-me os cisnes que são belos e formosos sobre a água mas perfeitamente atrapalhados em terra. Ela percebe e baixa a cabeça num sorriso comprometido, talvez envergonhada pela cena que protagonizou. Gostei da reação dela, a vida tende a ser bem menos complicada se nós soubermos rir de nós próprios.

Eu posso gabar-me de dizer que gosto do que faço, principalmente das vantagens de ser um trabalhador liberal no ponto de vista da flexibilidade do horário, e posso gabar-me de poder vadiar quando quero. Posso olhar para as almas repetitivas que vejo através das vidraças dos arranha-céus de Varsóvia, seres engaiolados que martelam em teclas de computador durante horas que se tornam meses. Ganham bem, têm belas gravatas e fatos caros, provavelmente uma inscrição no ginásio mais chique da terra e dentista gratuito. Uma série de benesses que servem para recompensar a total e obrigatória falta de criatividade e liberdade de espírito que estas pessoas formatadas patenteiam; quantas vezes me encontro com elas aos fins de semana e não lhes consigo extrair uma gota de sumo? A futilidade, os lugares-comuns, o ter em vez do ser. Execro essa vida vazia, essa sucessão de unidades de tempo iguais e assopro o passo até perto da estação de comboios suburbanos que abastece a Cidade Capital de mais operários, mais obedientes, mais robôs que trotam em direção aos transportes públicos como gestos programados e automáticos, fechados nos seus mundos de mp3. O tropel dos tacões diverte-me e eu sento-me num banco vendo-os, imaginando de onde vêm e a que horas terão acordado. Alheios, os jardineiros arranjam os canteiros para embelezar o largo, penteiam a relva curta e pisada com ancinhos para lhe darem cores mais primaveris e limparem os últimos vestígios de inverno.

Às vezes penso que, para algumas pessoas, os dias em Varsóvia são todos iguais como o devem ser em todas as grandes cidades mas depois recordo que os dias em Faro eram ainda mais iguais com a agravante de existirem as mesmas caras e os mesmos sítios, pouco muda e pouco de novo há para contar. Sentar-me neste banco em pleno coração da capital polaca a ler um livro faz-me sentir estar noutra realidade, num mundo muito mais amplo onde há mais lugares, mais pessoas e mais coisas para descobrir e conhecer. Mantendo a humildade de nunca esquecer as minhas raízes e de considerar a minha cidade a melhor do Mundo (e arredores) não posso deixar de sentir uma felicidade enorme de estar em Varsóvia, viver esta terra na sua plenitude e de sentir o prazer inefável de sentir um corpo feminino chegar-se perto de mim, interromper-me a leitura e dar-me os bons dias.

É óbvio que eu nunca escreveria estas linhas em Janeiro, nessa altura estaria muito provavelmente num café com um patrício a maldizer o clima desta terra e repetindo o título deste artigo vezes sem conta.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Polónia d.K.

meia-hasteComo se não bastassem todas as patifarias que o Destino fez à Polónia, ainda tinha de vir um vulcão islandês ensombrar o funeral do casal presidencial, vulcão esse que projetou uma tal quantidade de cinzas na atmosfera que obrigou a que o espaço aéreo polaco fosse inteiramente fechado à aviação comercial abrindo apenas exceções aos convidados para as exéquias fúnebres. Porém, muitos dos líderes europeus e mundiais que tinham confirmado presença em Cracóvia tiveram de cancelar a agenda devido à impossibilidade de voar desde os países onde de encontravam: Angela Merkl ficou retida em Itália, Obama não conseguiu chegar à Europa, o rei Carlos Gustavo não saiu da Suécia bem como o Príncipe Carlos que não pôde abandonar o Reino Unido. Saliente-se a atitude do presidente russo Dimitri Medvedev que arriscou a viagem de avião e as decisões das comitivas ucranianas, bielorrussas e checas viajaram para Cracóvia de carro. Curiosamente, Cavaco Silva estava retido em Praga, fez uma viagem de automóvel até Estrasburgo para regressar a Lisboa e não considerou dar um pulinho a Cracóvia desculpando-se com “problemas logísticos”. Deu a impressão de que não tinha mesmo vontade de prestar homenagem ao congénere polaco e ficou mal na fotografia, afinal eram apenas 4 míseras horas de carro.

A Polónia finalmente cumpriu o seu luto não sem que houvesse algum carnaval em torno do sucedido e exagero de declarações e atos. Desde logo a teima em associarem a extraordinária sequência de coincidênciasvelhinhas trágicas com conspirações russas, alguns polacos terão sempre os russos como inimigos eternos e não lhes dão o benefício da dúvida mesmo após o comportamento exemplar que Moscovo teve no decorrer desta semana. Putin envolveu-se pessoalmente na investigação do acidente, Medvedev disponibilizou a Varsóvia todos os recursos do estado russo desde peritos, equipamento técnico, psicólogos. Felizmente alguns altos responsáveis da nação reconheceram o gesto simpático do Kremlin e registou-se uma mini-cimeira entre Medvedev, o primeiro-ministro e o presidente interino polacos Tusk e Komorowski, uma reunião privada que durou meia hora e que teve lugar em Cracóvia durante o dia de hoje, uma reunião que pode determinar o princípio duma nova etapa na relação entre Rússia e Polónia.

pilsudskiego E o país respirou fundo. Tempo de levantar a cabeça, olhar firme para o futuro depois de Kaczyński e voltar à realidade depois duma semana de torpor e dormência onde as emoções falaram bem mais alto que a razão. O aeroporto da capital já reabriu ao tráfego aéreo, os varsovianos invadiram esplanadas e o parque de Pole Mokotowskie de bicicleta e patins, os websites vão voltar as suas cores habituais e as pessoas vão regressar à rotina, recuperando do trauma com a ajuda dum sol radioso que vai apoiando o povo sedento de normalidade. Já vai sendo tempo de esta gente voltar à Terra porque o mundo não pára, muito menos para chorar.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Polónia – dia 6

Minha Querida Polónia:

Ninguém pode calcular a tristeza que te invade depois de teres perdido a nata da tua classe política, diplomática e militar no acidente do passado domingo. Foi um caso que sensibilizou a Comunidade Internacional e que não deixou ninguém indiferente, conseguiste ver que a Rússia quer ser tua amiga e deitar o passado para trás e viste todos os teus colegas a mostrarem solidariedade e comoção, fazendo até menções de estarem presentes no funeral do teu presidente. Não podes dizer que ninguém prestou atenção, estamos todos contigo para te dar força e ânimo neste momento difícil. Eu falo pelos portugueses residentes em Varsóvia e posso afiançar-te que sentimos esta tragédia como nossa, como se tivéssemos perdido o nosso primeiro-ministro nas mesmas circunstâncias.

Mas, Polónia, há coisas que não compreendo. Diz-me lá porque é que vão sepultar Lech Kaczyński na Catedral de Wawel, se nesse espaço só estão antigos monarcas ou heróis da Tua História? Achas que Kaczyński teve a mesma dimensão que o Marechal Piłsudski? Ou a mesma grandeza que Mickiewicz? Explica-me quais foram os critérios que seguiram para considerarem Wawel como a última morada do presidente Kaczyński e não a do último presidente-no-exílio Ryszard Kaczorowski? É porque este último senhor foi efetivamente um herói, sobreviveu à II GG, comandou o Governo da Polónia desde fora do país enquanto este sofria com a ocupação soviética, mas vai ser enterrado num cemitério normal como todas as pessoas normais. Será que Kaczyński é um Herói Nacional? Ter-se-á destacado nalgum campo específico da história polaca? Para onde irá Lech Wałęsa quando morrer, vais seguir o mesmo precedente? E se Kaczyński tivesse morrido um dia depois de causas naturais, enterrava-se o corpo ao lado de Jan III Sobieski à mesma? Kaczyński era tão amado pelo seu povo quanto todas as figuras que estão sepultadas em Wawel? Os livros de história referir-se-ão a Kaczyński com os mesmos adjectivos que os seus vizinhos de tumba?

Eu tenho assistido ao desfile de alarvidades que leio todos os dias com a maior contenção e serenidade, não tenho legitimidade de me pronunciar sobre um assunto que não diz respeito à minha nacionalidade apesar de sentir a Polónia como meu país adotivo. Tenho lido a bárbara sugestão do padre Ryzyk de que o acidente foi um complot da PO mas esse imbecil só diz asneiras cada vez que abre a boca e não vê que estavam bastantes altos funcionários do mesmo partido PO entre as vítimas. Prestei homenagem às vítimas com a minha vela e flores, emocionei-me a sério e nem vi o Real Madrid – Barcelona com o meu pessoal como tinha combinado porque não me senti em condições de borgar, respeitando o pesar geral. Tenho também acompanhado esta novela do Wawel e tenho imaginado como se tem sentido a coitada da filha de Lech Kaczyński que parece ser a pessoa mais sensata deste enredo.

Mas, Polónia, a hipocrisia tem limites. Quando eu disse que nós – portugueses em Varsóvia – sentimos esta tragédia como se tivesse morrido o nosso primeiro-ministro eu queria dizer tal e qual isto: Que teria morrido um símbolo do país, é verdade, mas no qual ninguém se reconhecia. Bolas, Polónia! Tu não gostavas de Kaczyński, ninguém gostava dele, ele pouco fez para engrandecer a nação. Bem pelo contrário, foram mais as situações em que ele a embaraçou com as suas ideias demasiado conservadoras e nacionalistas. Ele ia perder as próximas eleições presidenciais, eram mais as pessoas que o queriam ver pelas costas do que as que o apoiavam, porquê esta fantochada toda de quererem encontrar-lhe as virtudes que ele não tinha? Era patriota? Era sim senhor, tal como todo o bom polaco que facilmente dá um braço pela Águia Branca. Era um democrata? Pois era, mas não mais que o comum polaco que passava horas debaixo de neve numa fila para comprar pão e papel higiénico. Então porquê todo este festival e porquê estas tentativas de endeusamento do senhor Kaczyński? Um funeral de Estado não seria suficiente para homenagear um Chefe de Estado?

E que diabos de ideia é esta de proibirem a venda e o consumo de bebidas alcoólicas em todo o país durante todo o próximo fim-de-semana, está tudo histérico ou começou uma caça às bruxas?

Polónia, minha querida… Desce à terra e sê razoável. Estamos todos verdadeiramente tristes mas não vamos transformar um acidente trágico num martírio em prol da causa polaca, os portugueses nunca iriam sepultar José Sócrates no Panteão Nacional tal como não fizeram com Francisco Sá Carneiro. Mais, Kaczyński foi a Smolińsk sem ser convidado oficialmente, foi por sua iniciativa e não estava oficialmente a representar o país.

Apresentando o meu profundo pesar mas apelando também às tuas serenidade e sensatez coletivas, saúdo-te como teu incondicional admirador e irreversível apaixonado.

Nuno

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Primavera

Primavera

Em Varsóvia, a primavera vale mais pela fauna do que pela flora.” – Mário Machado, 15.4.2010

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Estupidez

Cretino Estúpido é Tarcisio Bertone, o Secretinário de Estado do Vaticano, esse país guardião da Moral e dos Bons Costumes católicos, quando diz que os múltiplos casos de pedofilia envolvendo membros da Igreja Católica são culpa de homossexualidade e não do celibato sacerdotal. Todas as meninas que foram abusadas pelos padres terão certamente opinião contrária e não espantam as ondas de protestos que vieram de todo o planeta e que adensam a revolta contra o autismo minelar da Igreja. O Vaticano não consegue lidar com o problema nem com o impacto mediático à escala global que o caso ganhou, fecha-se nos seus dogmas, cai de gafe em gafe no descrédito e enrola-se numa cortina de fumo com o qual tenta repetir a fórmula de sempre. Nega as evidências ao recusar admitir o escândalo e classifica todas as notícias de “tentativas de minar a confiança dos fiéis”.

Estúpido Estúpidos foram Costinha e João Moutinho ao tentar vender a ideia de que perderam o dérbi porque o árbitro prejudicou o Sporting, dando como exemplo um lance de Luisão, esquecendo que Miguel Veloso entrou sobre Éder Luís como se estivesse a fazer audições para o “Karate Kid” sem sequer levar um aviso. Se Luisão devia ter sido expulso nesse lance? Eu não comento porque antes desse lance já o central benfiquista tinha agredido Tonel na área sportinguista com um murro, mas branquear uma exibição fraca como a que o Sporting protagonizou na segunda parte justificando-a com a arbitragem é uma demonstração de mau perder que não cai bem num clube que apregoa valores diferentes (para melhor). O Sporting caiu no ridículo com as declarações de Moutinho no flash-interview e pior ficou depois de Costinha ter feito aquele teatro na sala de imprensa, pôs o país inteiro a rir-se dele e recuou aos maus velhos tempos nos quais se justificava a incompetência dentro das quatro linhas com casos de más arbitragens. Pensava-se que o Portugal futebolístico ia passar o ano a rir-se das bacoradas de Jorge Jesus mas é do lado de Alvalade que vêm as maiores bacoradas. Feio mas mesmo feio, mais feio do que bater na mãe. Os sportiguistas não merecem ser tratados assim e com certeza não se revêem nas declarações infelizes dos seus responsáveis.

Estúpido foi o acidente que cobriu a Polónia de um luto que irá durar até domingo e do qual a população tenta reagir.

Por favor, leitor. Diga-me que eu não sou o único não-estúpido à face da Terra!

domingo, 11 de abril de 2010

Polónia – Dia 1

Na sequência do sucedido no dia de ontem, o Presidente do Parlamento assumiu a presidência interina da Polónia. Bronisław Komorowski anunciou uma semana de luto nacional, um gesto esperado e natural face à grande tristeza em que a Polónia está imersa após a maior catástrofe institucional dos últimos 50 anos, e tem agora três meses para marcar eleições presidenciais.

Palácio A consternação que varre a Polónia ja inspirou reações da comunidade internacional das quais destaco a de Lula da Silva que decretou três dias de luto estendendo “condolências sinceras e fraternais ao povo polaco” e do presidente georgiano Saakashvili que recordou a “ajuda inestimável prestada por Kaczyński no conflito da Ossétia”. O Presidente português lembrou que o seu homólogo polaco ia retribuir a sua visita oficial no próximo mês de Maio. O Povo une-se em torno de si próprio como que contando armas para mais um combate que se avizinha, analisa os danos e tenta reagir ao choque emocional, uma tarefa que seguramente não será fácil.

A tragédia teve um impacto indescritível, as pessoas ainda estão chocadas e não conseguem escolher palavras para lhes explicar o que lhes vai na alma. Há um enorme sentimento de perda, um vazio, uma tristeza profunda mesmo entre aqueles que não gostavam de Lech Kaczyński e que são a maioria da Polónia Urbana. De facto, o Presidente não era uma pessoa benquista entre os habitantes das cidades devido ao seu discurso demasiado conservador e às políticas tradicionalistas que tentava impor e que causaram alguns dissabores internacionais no tempo do Governo do seu irmão gémeo Jarosław, ele era até alvo de chacota e um dos principais protagonistas do anedotário polaco. No entanto toda a Polónia reconhece nele uma pessoa que, à sua maneira, lutou patrioticamente pelos interesses da Nação e os polacos, como povo extremamente patriota que são, prezavam isso em Kaczyński.

No acidente morreram também individualidades como o Presidente do Comité Olímpico da Polónia, o Governador do NBP (equivalente ao Banco de Portugal), o Ministro da Presidência, o diretor do Instituto da Memória Nacional, Ryszard Kaczorowski que foi o último Presidente-No-Exílio *, o Comandante das Forças Armadas, dirigentes da Comissão do Massacre de Katyń, o chefe da Agência Nacional para a Segurança, bispos entre outros. A dimensão da desgraça está patente à porta do Palácio Presidencial onde milhares de populares se juntaram espontaneamente para depositarem velas e flores, orarem pelos desaparecidos e ganharem algum ânimo em mais um momento difícil de provação.

Eu senti esta tragédia como minha também e fui ao Palácio apresentar as minhas condolências àqueles que morreram a caminho da terra maldita para presenciarem uma cerimónia de homenagem a compatriotas seus caídos pela Pátria. Katyń reclamou mais sangue polaco e estes nobres polacos prestaram tributo aos seus com as suas vidas, não podia haver homenagem maior.

* Depois da ocupação nazi e soviética de 1939, a Polónia formou um Governo reconhecido pelos Aliados que operava a partir do exterior (primeiro na França e depois em Londres a partir da queda de Paris) e que se manteve em funções até às primeiras eleições democráticas em 1990.

sábado, 10 de abril de 2010

Luto

luto Esta manhã a Polónia acordou sobressaltada, transpirada como se tivesse tido um pesadelo. Acordou ao som de SMSs, de telefonemas, de notícias perdidas e meias palavras. Ensonada, a Polónia acendeu a televisão, consultou a internet, esfregou os olhos incrédula e despertou cruamente ao som de uma tragédia: Um acidente aéreo vitimou o Presidente da República e uma comitiva constituida por altas individualidades do aparelho de Estado, da banca e do Exército. Eram 9:00 em Varsóvia quando, num instante, a Polónia perdia a sua cúpula política entre acessores do Presidente, ministros e deputados.

Este acidente inspirou muitas reflexões a partir de diversos quadrantes da sociedade polaca, aqui publico a minha. É incrível a quantidade de catástrofes a que a Polónia tem sido submetida desde sempre, as guerras, as intempéries, as invasões e ocupações, o sufoco Nazi e posteriormente Soviético. Parece que a Polónia está destinada a sofrer,a penar um sofrimento infinito que parece ter tréguas mas que ciclicamente regressa e inflige graves feridas. É de uma ironia macabra que altas patentes do Exército Polaco tenham morrido a caminho duma cerimónia que se destinava a selar o perdão oficial da Rússia pelo Massacre de Katyń sucedido há exatamente 70 anos. É também curioso constatar que o primeiro-ministro polaco Donald Tusk tenha estado no mesmo local a convite do seu homólogo russo apenas 3 dias antes do acidente. Outra curiosidade prende-se com o facto de Wojciech Jaruzelski também ter sido convidado para as celebrações, uma situação que causou grande celeuma por se considerar “escandaloso” que um dos principais responsáveis pelo regime opressivo da antiga República Popular da Polónia fosse representar o País na cerimónia. Jaruzelski acabou por declinar o convite depois de instalada a controvérsia e ficou em Varsóvia.

Agora discute-se muita coisa, que o Tupolev Tu-154M presidencial já tinha mais de 20 anos e que já se tinha equacionado (e sucessivamente adiado) a sua substituição, que foi um erro crasso ter colocado tantos dignatários da Nação na mesma aeronave - a amputação de tão importantes funcionários irá certamente despoletar uma crise institucional no seio da Polónia – e até uma horrorosa versão que classifica o desastre como uma manobra de martirização por parte de Kaczyński para que o Massacre seja lembrado para sempre como um ato indelével das intenções diabólicas da Rússia / URSS para com a Polónia.

Factual é apenas a informação que o avião caiu à quarta tentativa de aterragem, que as condições atmosféricas eram péssimas com nevoeiro cerrado e que a própria torre de controlo do aeroporto sugeriu que a aeronave aterrasse em Moscovo ou na capital bielorrusa Minsk. A caixa negra que já foi encontrada poderá ajudar na resolução deste mistério que resultou na morte de todos os 98 ocupantes do avião presidencial e no luto de 40 milhões de pessoas.

Mais uma vez a Polónia sofre as suas perdas, mais uma vez a Polónia chora os seus mortos, mais uma vez o patriotismo polaco é chamado, mais uma vez a resiliência dos polacos é posta à prova, mais uma vez a História se repete.

O meu avô era católico, uma vez disse-se descontente e descrente porque parecia-lhe que “quanto mais as pessoas acreditam piores coisas lhes acontecem”. A Polónia, como país profundamente católico, tem sofrido horrores desde que o tempo é tempo, não há memória de um povo e de um território tão sacrificados na sua existência. Mais uma vez o Destino mergulha a República na tristeza e na dor, uma dor que parece ser uma cruz que a Polónia terá eternamente de carregar enquanto o tempo for tempo. Um trabalho de Sísifo, um fado que esta terra – que nunca se rendeu – vive constantemente.

As minhas profundas condolências e respeitos para a Polónia, que nunca perecerá enquanto nós vivermos.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Suburbia

ABC do álcoolConsultando outros blogues de portugueses na Polónia, até consultando textos mais antigos deste mesmo blogue, ter-se-á uma noção do que é a Páscoa na Polónia, das tradições e do usos polacos nesta quadra. Não é propriamente a Páscoa que é o tema desta entrada mas sim o que se pode ver quando se vai passar o domingo de Páscoa nos subúrbios de uma capital europeia – A Páscoa nos Arredores de Varsóvia, em Piastów.

Viajando para oeste, na direção de Poznań, saímos de Varsóvia pela grande Avenida Jerozolimskie, a artéria principal de acesso à capital para quem entra por oeste / sudoeste. Passamos pelos centros comerciais Blue City e Reduta, pelas hiperinstalações do Leroy Merlin e dos três amigos que parecem andar sempre juntos neste país: Makro, Castorama e MediaMarkt. Paisagens que não são diferentes das de Katowice ou Lisboa, estas marcas estão representadas em todas as grandes cidades europeias e já não parecem estranhas a este algarvio. No Domingo de Páscoa está tudo encerrado, apenas as bombas de gasolina se mantêm disponíveis para os clientes que rodam sobre as estradas do país visitando parentes, mostrando netos, matando saudades. Varsóvia está vazia em contraste com o bulício das estradas nacionais, nota-se isso na curta viagem de 17km até Piastów, no concelho de Pruszków.

Piastów é um dormitório de Varsóvia, lá habitam (ou dormem) quase 24.000 pessoas numa área bastante pequena (aprox. 5km²) o que Prédio 1confere a segunda taxa de densidade populacional mais alta do país, 4007 hab/km² depois dos 4084 hab/km² de Świętochłowice na Silésia. Piastów sofre dum problema interessante de analisar que se traduz na quase totalidade dos seus habitantes que trabalham em Varsóvia mas que têm os serviços administrativos sediados em Pruszków, o que causa transtornos à população que tem a sua vida estabelecida em Varsóvia sem ter qualquer elo de ligação a Pruszków, cidade outrora infame devido à Mafia lá estabelecida que batalhava com os seus rivais de Wołomin pelo controle do crime organizado na Capital, tema que um dia hei-de focar. A vantagem duma cidade destas é que é extremamente tranquila, não se passa nada e as pessoas podem gozar da calma absoluta que se vive em Piastów, uma calma que pode até enervar os mais inquietos.

O que há para dizer da Páscoa em Piastów? Pouco mais que aqueles que também escreveram sobre este período, ou seja, enormes quantidades dePrédio 2 comida cuidadosamente previamente benzida e preparada para receber os convidados que são normalmente parentes que moram em paragens distantes, mais ou menos missa consoante o grau de catolicismo da família (parece que a família da Ewa não é muito praticante, ainda bem) mas de Piastów ficam algumas imagens insólitas. Não fosse o alcoolismo um problema grave na sociedade polaca e bem que se podia fazer algumas piadas com a imagem que está no topo deste texto dizendo que o sistema educacional polaco está tão avançado que ensinam o abecedário com analogias ao álcool – Absinto, Brandymel, Cerveja – nem que sejam em barracas de pré-fabricado.

Última nota para uma situação que verifiquei e que não anda muito longe do que se pode encontrar no meu país: Na rua da estação dos comboios, dois prédios geminados. Um arranjado e pintadinho, cuidado e sorridente, outro decrépito e velho, o reboco a cair das paredes. No prédio cuidado nenhum sinal exterior, no prédio velho havia quatro antenas parabólicas, duas delas a sair da mesma janela. Pode não haver dinheiro para o essencial mas para os luxos não falta. Cada vez mais acho a Polónia parecida a Portugal.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Cent’anni

SC Farense

Onde quer que esteja, quando quer que seja, Farense até morrer!

Viva o Farense e viva o seu centenário!

É impossível não chorar aos 6:00 mins deste filme.