O Estádio Nacional foi inaugurado desportivamente na noite de hoje em Varsóvia tendo como prato forte o jogo entre as seleções principais da Polónia e de Portugal, desafio que despertou entusiasmo e expetativa entre os polacos e que resultou numa afluência massiva de mais de 50.000 pessoas ao recém-concluído estádio ansiosas por testemunhar o primeiro jogo na estrutura desportiva mais importante do país.
Varsóvia engalanou-se para o baile, deu tréguas no frio a futebolistas portugueses e fez subir a temperatura até aos 6º C, um rebuçado comparado com os –12º C que infligiu aos sportinguistas há dias. O público era na esmagadora maioria da casa e só esporadicamente se podia vislumbrar um ou outro tímido ponto verde e uma bandeira lusa no imenso mar branco e vermelho que eram as bancadas no Narodowy, dezenas de milhar de polacos que bem cedo começaram os cânticos de apoio à sua equipa e até a fazer a onda mexicana, coisa invulgar nesta terra de comportamentos mais circunspetos. Quando os acordes d'A Portuguesa entoaram pelo menos três portugueses acompanharam o hino com uma mão no coração e outro no pulmão, é que a festa era polaca mas o esplendor é de Portugal. Estrofes sentidas, a Pátria ali no relvado, nós de volta à raíz, ao berço, à terra, o John abraçado ao Dani, o Dani abraçado a mim e eu a abraçar o lado esquerdo do peito. O nosso hino é de uma pujança e de uma solenidade que só devia ser tocado por decreto. De repente e no meio do hino... as palmas, o estádio a bater palmas ao hino português, uma reação inesperada que prova que o adepto de futebol polaco não pode ser representado na sua totalidade pelos arruaceiros que puseram Lisboa em estado de sítio quando a Legia foi lá jogar. Linda, a homenagem do público polaco à canção portuguesa retribuída com um respeitoso silêncio enquanto A Mazurka de Dąbrowski se ouvia. Tal como eu havia dito em declarações prestadas a uma estação televisiva polaca, este era um jogo de festa entre dois países amigos e sem razões para quezílias. Estavam lançados os dados, o jogo ia principiar.
Mais compromisso por parte dos voluntariosos jogadores polacos, mais envolvimento, mais aguerridos e mais entregues ao jogo enquanto os portugueses trocavam calmamente a bola entre si. A festa era polaca e eles é que tinham de entreter o público que pedia constantemente golos, notando-se essa sede de golos sempre que a seleção da águia recuperava a bola e ensaiava envolvimentos ou conseguia trocar a bola a meio campo, mesmo sem progressão. Sentia-se a emoção a cada metro ganho, a cada passe metido, a cada finalização de lance ainda que frouxa. O público puxava pelas suas cores mas Portugal arrefecia os ânimos eslavos quando Nani galgava pelo seu corredor, sentia-se que Portugal podia marcar um ou dois golos na primeira parte caso pisasse um pouco mais no acelerador mas também se viu que os jogadores portugueses não tinham muito interesse nisso, para não estragar a festa dos simpáticos anfitriões e para não se exporem a lances mais viris que resultassem em lesões mal-vindas numa altura em que se jogam partidas decisivas para os desfechos de várias ligas europeias e para as próprias competições da UEFA. E foi assim que o jogo se desenrolou, uns podendo ganhar e não querendo, outros querendo ganhar mas não podendo, um 0-0 insonso que não feriu suscetibilidades e que embalou as muitas cervejas e vodcas que transpiraram naquelas bancadas como testemunha a imagem acima.
Não me vou alongar nas apreciações técnico-táticas porque não sou jornalista desportivo nem é essa a natureza deste espaço, este é o ponto de vista dum português que mora em Varsóvia e nesse aspeto fiquei muito agradado com o estádio enquanto recinto desportivo e seguramente será motivo de orgulho e honra para os polacos e para os varsovianos em particular. Uma única chamada de atenção para o dispositivo de escoamento da multidão – As autoridades policiais encerraram a ponte Poniatowski ao trânsito e cortaram os transportes públicos nos dois sentidos desde a Rotunda Washington até à Rotunda de Gaulle obrigando as pessoas que assistiram ao jogo a percorrer dois quilómetros a pé pelo tabueiro da ponte que passa por cima do rio Vístula até aos autocarros e táxis que estavam na margem oeste do rio num processo fácil de vazar o estádio e suas imediações mas não muito confortável para pessoas com dificuldades de locomoção. Solução típica do Leste: É soltá-los e eles que se amanhem! Polónia e Portugal não têm um passado de problemas entre adeptos e por isso não houve confusões no trajeto mas não pude deixar de pensar “E se um gajo com os copos resolve meter-se comigo por causa do cachecol de Portugal? E se se dá aqui uma caldeirada das antigas, malta ponte abaixo, como é que é?” Não houve problemas porque não houve provocações de parte a parte mas pergunto-me como será se um dia a Inglaterra (ou a Rússia, ou, pior!, a Alemanha) vierem disputar jogos oficiais a Varsóvia.
E se estivessem os –12º C que ripei com os munines no Pepsi Arena há quinze dias?
1 comentário:
Muito bom! No dia do jogo passava em frente de uma "kamienica" manhosa, daquelas típicas de Łódź, onde se viam uns carecas de cerveja e cigarro na mão, fato de treino e meia branca a gritarem Polska junto com as suas "kobiety".
Um português ali a uns metros de distancia, a sorrir e a berrar na sua mente... PORTUGAL! PORTUGAL! :))
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