Terei abusado um pouco da sorte e puxado demais pelo organismo ou então isto é mesmo uma enorme bosta, escala que estou a fazer em Liverpool em trânsito para Faro. Como atenuante conste que estou a escrever com apenas 90 minutos de um irregular sono espremido entre as últimas assinaturas em papéis do trabalho, colheita de peúgos e boxers a esmo (só quando chegar a Faro é que vou ver se as meias que joguei para a mala têm par) e um serôdio jantar à 1:30. Isto tudo com voo marcado para as 5:00, então aceitemos que eu esteja um bocado impertinente agora.
A volta que se dá no céu é bonita e revela-nos o rio Mersey, um leito de sonolentas águas pardacentas que escorre tranquilo para o mar da Irlanda enquanto banha as fábricas e docas que o ladeiam. O nome Mersey transporta-me imediatamente para o Merseyside Derby, jogo de futebol entre as equipas mais representativas da cidade – o Liverpool FC e o Everton FC – e por isso estico o pescoço na tentativa de vislumbrar os holofotes de Goodison Park ou Anfield Road, casas de toffees e reds respetivamente. Não consigo captar nada a não ser portos e casario baixo e escuro e fico sem ver onde jogaram nomes da minha infância como Ian Rush, John Barnes ou Bruce Grobbelaar por parte do Liverpool ou Greame Sharp, Gary Lineker ou Neville Southall, figuras do Everton. Há apenas a pista do aeroporto John Lennon – Above us only sky – que dá a sensação de começar ainda dentro do rio. A abordagem à pista é feita quase rés ao Mersey e a ideia que se tem é que o avião vai raspar o telhado a algum dos armazéns e hangares que se encontram nas margens. Contudo a aterragem é feita sem precalços arrancando aplausos a alguns campónios que insistem neste comportamento quinto-mundista, sempre perguntei que tipo de aterragem eles iriam classificar com vaias e assobios.
O controle dos passaportes é feito por uma simpática cinquentona que me pergunta como estou, se tenho sono (wtf?) questão provavelmente inspirada nas olheiras que devo ter e sugere uma bela chávena de café para arribar. Retribuo-lhe a gentileza, desejo-lhe um bom dia e, esfomeado, vou às comprar no supermercado do aeroporto. Logo se instala uma certa desilusão ao ver a prateleira das sandes carregada de sugestões hiperpesadas para um estômago mediterrânico com pães de centeio entremeados de pickles e maioneses aromatizadas, mostardas e molhos de Worcester, Eggs and Bacon. Não há um Bollycao, uma sandes de queijo e fiambre, um croissant misto. A escolha recai numa Chicken & Bacon Club Sandwich on Malted Bread, um biscoito de aveia com cobertura de chocolate e um litro de leite, néctar indispensável para a manutenção do meu sistema. Mas é mau, o leite é muito mau. Sabe a plástico, um paladar industrial, artificial, sem alma nem amor tal como a sandes e a única coisa que se safou foi logo aquela de que eu mais desconfiava, o biscoito de aveia que minimizou o dano.
Sempre fui um fiel adepto do Manchester United nem Cristiano Ronaldo era nascido, e vibrei quando ganharam a Taça das Taças ao Barcelona com um golo do Sparky, quando Mark Robins eliminou o Oldham e salvou o emprego a Sir Alex Ferguson. Assisti à substituição do lendário capitão Bryan Robson por Roy Keane, um pequeno irlandês arruaceiro que bateu o recorde de transferência no Reino Unido, as assistências de Brian McClair, os carrinhos assassinos de Paul Ince – The Guv’nor- as comemorações doidas de Lee Sharpe, as correrias desenfreadas de Kanchelskis, as torres do centro da defesa Pallister e Bruce, a ascensão ao trono de Eric “The King” Cantona – o melhor estrangeiro de sempre da liga inglesa, a fornada de Alex Babes (Butt, Giggs, Scholes, Beckam, os irmãos Neville), Peter Schmeichel que é o meu maior ídolo pós-Dasaev, os gémeos-do-golo Andy Cole e Dwighy Yorke, Teddy Sheringham mais Baby Face Killer Solskjaer naquela incrível reviravolta em Nou Camp na final da Liga de 1999 quando o speaker do estádio já tinha o cd com músicas do Bayern pronto a tocar na aparelhagem e a influência portuguesa da última década consubstanciada nas excelentes prestações de Cristiano Ronaldo e Nani e na esperança Bebé. O bom fã do United detesta o Liverpool FC, eu detesto o Liverpool FC (e faço pouco do Arsenal, eternos falhados, perpétuos descampeões) e sinto-me em Liverpool como um muçulmano em Tel-Aviv. Com o pequeno-almoço que tive e com a bisonha paisagem cinzenta que tenho de fora do aeroporto apetece mesmo apanhar um dos autocarros que estão ali na paragem a dizer St. Helens – Runcorn – Manchester e abalar para prestar culto no Teatro dos Sonhos. Fica para a próxima, oxalá que seja em breve.ps – Ai, e tal… Foste comprar sandes de supermercado, querias o quê? Pãozinho quentinho e manteiguinha a derreter? Não, mas em Luton e em Bruxelas também fui ao supermercado e fiquei bem servido.
1 comentário:
For ninety minutes we'll let them know. It's Man United - here we go.
O United esta em transicao. Espero que o Fergusson tenha imensa lucidez para continuar com os bons resultados que tem tido ate aqui. E verdade que os babies do Fergusson ja eram. Agora ha outros valores que precisam de se levantar. Espero que o Nani com um pouco de humildade se aguente no United e possa marcar a historia do United tal como fez e muito bem o nosso Ronaldo (quanto a mim nunca deveria ter saido - Dona Dolores e boa mae mas ma conselheira... palavra de adepto do United)
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