Ora, neste saudoso Liceu só se podia entrar pela larga escadaria central, degraus altos e espaçosos feitos em mármore onde os diversos grupos de estudantes se espalhavam consoante o seu “clube”. Lá estavam os surfistas, de quem nunca gostei, os motards, com quem nunca me dei mas que também não me fizeram mal nenhum, os metaleiros, que me repugnavam, os betos, coisa irritante de tanta futilidade em tão pouca idade e os meus, os crominhos da bola, de perna arqueada e sempre a discutir constituições de equipa e esquemas táticos. Era lindo estar nessas escadas no início do ano letivo e ver as meninas do Colégio do Alto, instituição reservada apenas a estudantes do sexo feminino, que tinham estudado até ao 8º ano só com outras raparigas e as freiras do Colégio, meninas que nunca tinham interagido com rapazes no ambiente escolar e vinham cheias de curiosidade, com vontade de socializar. Passavam pelos motards que estavam logo no portão, subiam a tal escadaria entre betos e surfistas (grupos que conviviam saudavelmente) e no topo da escada, perna arqueada, lá estavam os cromos da bola para lhe darem as “boas-vindas”.
Essas escadas eram um tribunal, um comité de avaliação ao qual os novos alunos se submetiam para que lhes fosse atribuido um “grupo”, quando o/a aluno/a chegasse ao cimo da escada já tinha um carimbo na testa onde mencionava o grupo a que ele iria pertencer enquanto fosse aluno do Liceu, sem apelo. Eu gostava muito do meu grupo, tinha orgulho em participar nas coisas do futebol da escola e nunca quis misturar-me com os outros, apenas fiz uma incursão noutros grupos quando fui manager da primeira boys-band de Faro, os “Sem Limites”. Tinha amigos motards, um ou dois surfistas, também um incógnito metaleiro mas nunca tive amigos betos nem os queria ter. Detestava o cabelo por cima das orelhas, aquele nó que ata o pulôver ao peito que é marca registada, os vincos nas calças de ganga, um conjunto de ícones ridículos que nunca apreciei. Isso era o Liceu na segunda metade dos 80.
20 anos depois, estou tranquilo e descansado a preparar o ataque ao semestre inverno-primavera quando a Agata aproxima-se e num português acima da média pergunta:
- Compraste esses sapatos em Portugal, não foi?
- Er…Sim, como sabes?
- Eu vi logo, esses sapatos à betinho não existem na Polónia. É tipicamente português. – e foi à vida dela, rindo-se não sei se rindo para mim ou de mim.
Eu fiquei a olhar para os sapatos. Ok, são sapatos de vela mas serei eu beto por ter um par de sapatos de vela? Serei toxicodependente por fumar um pato? Serei alcoólico por beber uma imperialzinha? Ainda levantei a cabeça para lhe responder mas ela já tinha ido embora. Para testá-la, hoje calcei de novo os sapatos de vela e, pior!, vesti uma camisa aos quadrados. Ela que repita a gracinha que lhe atiro logo com o título deste post! Beto, eu? Mas qual beto? Atão os betos usam moicano?!* “Formiga Branca” é o nome que se dá em Faro às pessoas que não fazem mais nada na vida senão dizer mal dos outros, pôr defeitos, agourar e consumirem-se de inveja devido ao sucesso dos outros.
3 comentários:
Com os 'futeboleiros' não me dava pelo simples facto de não perceber patavina da bola mas acabava por cair no estilo beto com o tal nó na camisola e o belo do sapato de vela - apesar de ser dos poucos que não tinha uma Yamaha DT LC ou o Lancia Y10. Era um 'beto' meio teso que tinha um Fiat 128 enferrujado. :)
Quanto aos sapatos de vela tenho de pensar em comprar uns quando for a Portugal.
bicho da bola na zawsze!
Do que este post me veio lembrar.... as minhas lutas uma ou outra vez corporais com essa gente que se chamam betos. Talvez eu fosse mais um cromo da bola porque as segundas e quando haviam competicoes europeias eu era ferrenho.
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